5. Imposição de obrigações no mercado grossista de teledifusão digital terrestre gratuito para os utilizadores finais


5.1 Nas secções anteriores foi identificado e analisado o mercado grossista de televisão digital terrestre gratuito para os utilizadores finais, tendo-se concluído que a MEO detém PMS nesse mercado.

5.2 Neste contexto, nos mercados onde existe PMS, a ANACOM deve impor uma ou mais obrigações regulamentares1.

5.3 Conforme é sabido, o quadro regulamentar em vigor privilegia a imposição de obrigações ao nível dos mercados grossistas, podendo, apenas em último recurso, impor-se medidas regulamentares nos mercados retalhistas. Esta primazia apresenta a vantagem de procurar resolver as falhas de mercado através de medidas impostas diretamente na raiz dos problemas. Por último, há ainda que referir que o princípio da primazia da imposição de obrigações nos mercados grossistas deve estar alinhado com o objetivo, consagrado no artigo 5.º da LCE, de promover o investimento eficiente em infraestruturas e a inovação.

Princípios tidos em conta na imposição, manutenção, alteração e supressão das obrigações

5.4 De forma a minorar ou eliminar os problemas concorrenciais existentes num determinado mercado, esta Autoridade deve selecionar as obrigações que, direta ou indiretamente, afetam as variáveis estratégicas da(s) empresa(s) com PMS, assegurando que tais obrigações se revistam de determinados requisitos, já identificados no capítulo 1 do presente documento.

5.5 Deste modo, a ANACOM deve adotar uma intervenção proporcional e devidamente justificada, no cumprimento do quadro regulamentar nacional e europeu, impondo o mínimo de obrigações que permitam ultrapassar os problemas de concorrência identificados, sem discriminação indevida relativamente a qualquer entidade, e que contribuam eficazmente para a evolução para uma situação concorrencial.

5.6 A ANACOM tem por objetivos primordiais de regulação promover a concorrência na oferta de redes e serviços de comunicações eletrónicas, contribuir para o desenvolvimento do mercado interno da União Europeia e defender os interesses dos cidadãos (artigo 5.º da LCE). Incumbe especialmente à ANACOM assegurar que os utilizadores obtenham o máximo benefício em termos de escolha, preço e qualidade, assegurar a inexistência de distorções ou entraves à concorrência no sector das comunicações eletrónicas, bem como encorajar investimentos eficientes em infraestruturas e promover a inovação.

5.7 Para este efeito, de acordo com os artigos 67.º a 72.º e 74.º a 76.º da LCE, as obrigações suscetíveis de serem impostas à(s) entidade(s) com PMS nos mercados relevantes identificados são:

(a) Dar resposta aos pedidos razoáveis de acesso e utilização de elementos de rede específicos e recursos conexos.

(b) A transparência na publicação de informações, incluindo propostas de referência.

(c) A não-discriminação na oferta de acesso e interligação e na respetiva prestação de serviços e informações.

(d) A separação de contas quanto a atividades específicas relacionadas com o acesso e ou a interligação.

(e) O controlo de preços e contabilização de custos.

5.8 Na análise e definição das obrigações a impor (ou suprimir) são também tidos em conta os princípios estabelecidos no âmbito da posição comum do ERG sobre a matéria, apresentada no documento “Revised ERG Common Position on the approach to appropriate remedies in the ECNS regulatory framework”, de maio de 2006 2.

5.9 Em conclusão, tendo-se identificado e analisado um mercado no qual deve existir regulação – o mercado grossista de teledifusão digital terrestre gratuito para os utilizadores finais –, esclarece-se que a imposição (ou manutenção/alteração) e controlo do cumprimento dessas obrigações de forma objetiva, detalhada e rigorosa constituem uma prioridade para a ANACOM. A concretização desse objetivo com sucesso será um aspeto importante para os clientes da plataforma de TDT, resultando em ganhos líquidos para o bem-estar geral.

Obrigações atualmente em vigor

5.10 Como atrás referido, o mercado grossista de teledifusão analógica terrestre deixou de existir com o switch off e, como tal, as obrigações regulamentares impostas à MEO caducaram naturalmente por falta de objeto, não se colocando por conseguinte a questão da determinação da sua supressão, uma vez que na prática já estão suprimidas.

5.11 Também não existem atualmente, em relação ao mercado grossista de teledifusão digital terrestre gratuito para os utilizadores finais, obrigações decorrentes de uma análise de mercado.

5.12 As obrigações a que atualmente a MEO se encontra sujeita encontram-se definidas no DUF ICP-ANACOM n.º 6/2008, por remissão para a proposta apresentada pela MEO no âmbito do concurso relativo ao MUX A ou por imposição posterior da ANACOM no quadro legal e regulamentar aplicável. Assinala-se ainda que foram impostas novas obrigações de cobertura através de decisão de 01.10.2015 3.

5.13 No que se refere às obrigações assumidas pela MEO no âmbito do concurso público que estão mais relacionadas com as obrigações que se podem definir ao abrigo do artigo 66.º da LCE, em caso de inexistência de concorrência efetiva no mercado, destacam-se as seguintes4:

(a) acesso ao serviço de TDT para:

a. Os operadores licenciados ou concessionados à data de entrada em vigor da Lei n.º 27/2007, de 30 de julho, ou seja, RTP1, RTP2, SIC e TVI em todo o território nacional, bem como RTP Açores e RTP Madeira nas respetivas regiões autónomas (em definição standard).

b. Ao canal televisivo a licenciar ao abrigo da Lei n.º 27/2007, de 30 de julho e da Portaria 1239/2008, de 31 de outubro, em todo o território nacional (em definição standard)5.

c. Ao canal constituído por elementos de programação de todos os operadores licenciados, concessionados ou a licenciar mencionados anteriormente (em alta definição) – até ao switch off6.

(b) capacidade total mínima a reservar pela MEO para a difusão dos diferentes canais7:

a. 9,0 Mbit/s e 640 kbit/s, respetivamente para as componentes de vídeo e de áudio, no território nacional dos canais em definição standard.

b. 10,8 Mbit/s e 768 kbit/s, respetivamente para as componentes de vídeo e de áudio, nas regiões autónomas, dos canais em definição standard.

c. 5,0 Mbit/s e 384 kbit/s, respetivamente para as componentes de vídeo e de áudio, no território nacional, para o canal em alta definição8;

d. Para além das obrigações já mencionadas para transmissão em definição standard, a MEO deve garantir, quando necessário, capacidade e assegurar a transmissão daqueles canais televisivos em ecrã largo, formato 16:9.

e. Se e quando requerido pelos operadores de televisão, a MEO deve assegurar capacidade suplementar para qualidade de áudio melhorada9, exploração de guias eletrónicos de programação e de outros serviços interativos, funcionalidades que proporcionem o acesso das pessoas com limitações visuais e auditivas às respetivas emissões de televisão e serviços de teletexto.

(c) cobertura do serviço10:

a. Garantir a cobertura de 100 por cento da população no final do 4.º trimestre de 2010, sendo que 87,26 por cento da mesma deverá ser coberta por radiodifusão digital terrestre11.

b. Garantir que, no final da implementação da rede, a cobertura mínima da população através da rede de difusão terrestre corresponde a 90,12 por cento no território nacional, a 87,36 por cento na região autónoma dos Açores e a 85,97 por cento da população na região autónoma da Madeira;

c. Garantir que à população cuja cobertura for assegurada através do recurso a meios complementares (DTH) sejam disponibilizados pelo menos os mesmos níveis de serviço e condições de acesso dos utilizadores finais equiparáveis aos da rede de difusão digital terrestre.

(d) parâmetros de qualidade de serviço e desempenho da rede:

a. Grau de disponibilidade do Centro de Difusão Digital de 99,9995 por cento para um período de cinco anos.

b. Grau de disponibilidade final da rede de transporte e de difusão de 99,9906 por cento para um período de dois anos.

(e) contrapartida a receber pela MEO pelos níveis de cobertura garantidos e pelas características da oferta que os operadores de televisão poderão disponibilizar aos utilizadores finais12:

a. A MEO pode cobrar aos operadores televisivos um preço médio anual de disponibilização do serviço por Mbit/s, nos primeiros dez anos a contar da data de emissão do título de utilização de frequências nos termos da proposta apresentada, em concreto na proposta relativa ao cenário variante.

b. Os preços médios anuais de disponibilização do serviço por Mbit/s podem ser revistos mediante acordo com os operadores de televisão e devem ser comunicados à ANACOM.

5.14 Por último e ainda que não diretamente relacionada com o serviço grossista de teledifusão gratuita é essencial considerar a obrigação de assegurar a transmissão, incluindo a codificação, multiplexagem, transporte e difusão dos canais já mencionados anteriormente, sem exigência de qualquer contrapartida aos utilizadores finais.

Quadro 1. Relação entre as obrigações decorrentes do concurso relativo ao MUX A e as obrigações passíveis de impor ao abrigo da LCE

Obrigações

DUF ICP-ANACOM n.º 6/2008

LCE

Acesso e utilização de recursos de rede específicos

Existente para os operadores televisivos licenciados/a licenciar no que diz respeito ao serviço de teledifusão

Artigo 72.º

Transparência na publicação de informações

Inexistente13

Artigos 67.º e 68.º

Não discriminação na oferta de acesso e interligação e na respetiva prestação de informações

Existente implicitamente14

Artigo 70.º

Separação de contas quanto a atividades específicas relacionadas com o acesso e ou a interligação

Inexistente

Artigo 71.º

Controlo de preços, contabilização de custos e reporte financeiro

Existente parcialmente

Artigo 74.º

5.15 Comparando as obrigações que decorrem do concurso relativo ao MUX A e as obrigações passíveis de impor ao abrigo da LCE, verifica-se que as obrigações decorrentes do concurso público realizado não são tão exigentes quanto aquelas que podem ser impostas na sequência de uma análise de mercado.

5.16 Em relação ao acesso trata-se de matéria que poderá estar também relacionada com os princípios de pluralismo e diversidade, sendo também do interesse da MEO o acesso de operadores de televisão ao MUX A, já que é do seu interesse promover a máxima ocupação deste MUX.

5.17 No que diz respeito às obrigações relacionadas com a não discriminação, com a transparência na publicação de informações e com o controlo de preços e reporte financeiro, verifica-se que na sequência do concurso ficaram definidas algumas obrigações de âmbito mais geral mas que não correspondem plenamente à aplicação destes princípios.

5.18 Verifica-se nomeadamente que a MEO está obrigada a cumprir determinados níveis mínimos de cobertura e disponibilidade de serviço, não existindo contudo uma obrigação específica de não discriminação relativamente a todos os operadores televisivos, sem prejuízo do referido atrás em relação à obrigação de não discriminação de cada um dos operadores de televisão face a outros operadores seus concorrentes no mercado de televisão, prevista nos contratos. Refira-se também que a MEO não se encontra obrigada a prestar informação sobre as condições em que presta efetivamente os serviços aos vários operadores para além do que está publicamente disponível (e.g., no direito de utilização de frequências atribuído). Não está assim plenamente garantida a existência de transparência relativamente às condições em que os serviços de teledifusão grossista são prestados.

5.19 Verifica-se ainda que, apesar de a MEO poder cobrar aos operadores de televisão um preço médio anual de disponibilização do serviço por Mbit/s, nos primeiros dez anos a contar da data de emissão do respetivo título, nos termos da proposta apresentada15, não existe qualquer tipo de obrigação relacionada com a contabilização de custos e reporte financeiro que permita avaliar se as margens auferidas neste serviço, em que, reitera-se, a MEO é o único operador a atuar no mercado, são excessivas. Também não decorre da realização do concurso público qualquer obrigação de separação de contas quanto às atividades específicas relacionadas a prestação do serviço de teledifusão, o que pode dificultar desde logo o acesso a dados de custeio de forma periódica e a subsequente avaliação do preço do serviço de teledifusão digital terrestre baseada nesses dados (nomeadamente tendo em conta o princípio da orientação dos preços para os custos).

5.20 Conclui-se, assim, que as obrigações atualmente aplicáveis à MEO, nomeadamente aquelas decorrentes do concurso relativo ao MUX A, não garantem um grau de proteção da concorrência no serviço de teledifusão tão elevado quanto aquele que pode existir através das obrigações regulamentares ex ante que podem ser impostas na presente análise de mercados.

5.21 Assim, nas secções seguintes do documento, partindo das obrigações já em vigor no mercado em análise, tomando em consideração os princípios aplicáveis à imposição de obrigações nos mercados relevantes e os motivos que estão na base da existência de PMS neste mercado, esta Autoridade analisa se é adequado impor obrigações, avaliando as mesmas face aos princípios e requisitos previstos na LCE e face às atuais condições do mercado. Note-se que serão considerados os problemas concorrenciais atuais e os que potencialmente poderão surgir no âmbito do mercado em análise no período que decorre até à realização da próxima análise de mercado16.

Avaliação das obrigações

Acesso e utilização de recursos de rede específicos

5.22 Ao ponderar a possibilidade de impor ou não uma obrigação de acesso, a ANACOM tem em conta o artigo 72.º, n.º 4, da LCE, segundo o qual a avaliação da proporcionalidade desta obrigação passa, designadamente, pela análise da “viabilidade técnica e económica da utilização ou instalação de recursos concorrentes, em função do ritmo de desenvolvimento do mercado, tendo em conta a natureza e o tipo da interligação e do acesso em causa; viabilidade de oferta do acesso proposto, face à capacidade disponível; investimento inicial do proprietário dos recursos, tendo em conta os riscos envolvidos na realização do investimento; necessidade de salvaguarda da concorrência a longo prazo”.

5.23 A este respeito, considerando que o acesso ao serviço de teledifusão digital terrestre já existe e se manterá por via do disposto no DUF ICP-ANACOM n.º 6/2008, a viabilidade de oferta do acesso proposto face à capacidade disponível encontra-se demonstrada. A própria génese do mercado é a evidência da viabilidade da existência de acesso ao serviço: o modelo de negócios e o próprio planeamento e definição do investimento e estrutura do mercado foi já pensado desde o início com o acesso ao serviço de teledifusão como um elemento constituinte do mercado.

5.24 Conforme já mencionado, não decorre do concurso de atribuição das frequências para utilização no âmbito da teledifusão digital terrestre que a MEO tenha que dar acesso ao serviço de teledifusão grossista a outros operadores televisivos que possam eventualmente vir a surgir no mercado.

5.25 Acresce que eventuais decisões sobre a possibilidade ou a obrigatoriedade de extensão do acesso a outros operadores televisivos, nomeadamente no quadro de regras de transporte obrigatório (must-carry), extravasam o âmbito da análise de mercados.

5.26 Assim, a ANACOM considera suficientes as obrigações de acesso ao serviço de teledifusão televisiva terrestre, previstas na lei e decorrentes do concurso público para atribuição de um direito de utilização de frequências para o serviço de radiodifusão televisiva digital terrestre.

Não discriminação

5.27 Em conformidade com o previsto nos artigos 66.º e 70.º 17, ambos da LCE, a ANACOM entende que é objetivamente justificável impor uma obrigação de não discriminação no mercado em análise, de forma a impedir que a MEO possa, em circunstâncias equivalentes, discriminar entre operadores de televisão.

5.28 A existência de condições de fornecimento discriminatórias a alguns operadores de televisão, a ocorrer, poderia influenciar negativamente a qualidade dos serviços desses operadores a nível retalhista. Esta situação traduzir-se-ia numa redução significativa da capacidade competitiva dos operadores de televisão discriminados, podendo inclusivamente influenciar negativamente outros mercados associados à cadeia de valor do mercado retalhista de televisão gratuita para o utilizador final (e.g., mercado publicitário).

5.29 Considera-se também que a existência de uma obrigação de não discriminação é especialmente adequada caso o operador com PMS no mercado grossista de teledifusão digital terrestre gratuito para os utilizadores finais passe a ter alguma relação mais profunda e direta com o mercado retalhista das ofertas de televisão. Note-se que, nesta situação, os incentivos e a possibilidade de existência de situações de prestação do serviço grossista em condições discriminatórias aumentam significativamente.

5.30 Neste contexto, entende-se que a imposição da obrigação de não discriminação é justificada, adequada e proporcional face aos (reduzidos) custos inerentes à sua implementação.

5.31 A este propósito salienta-se que esta obrigação de não discriminação deve aplicar-se a todos os operadores de televisão, independentemente de serem, ou não, beneficiários das obrigações de transporte impostas a empresas que oferecem redes de comunicações públicas utilizadas para a distribuição ao público de serviços de programas televisivos excluindo-se, neste contexto, o Canal Parlamento, dada a sua natureza especial.

5.32 De facto, nos termos da Lei n.º 36/2012, de 27 de agosto, que alterou a Lei n.º 6/97, de 1 de março, permitindo a disponibilização dos trabalhos parlamentares na rede de teledifusão digital terrestre, verifica-se que se mantém (como na lei originária) um dever de disponibilização do sinal por parte da Assembleia da República e um direito de transmissão do sinal/acesso ao sinal por parte dos operadores de distribuição de serviços de programas televisivos. Dito de outro modo, não é fixada por esta via à MEO, enquanto operador da rede de teledifusão digital terrestre, uma obrigação de reserva de capacidade e de transporte do Canal Parlamento, como, aliás, também não o foi fixado no âmbito da transmissão deste canal nas redes de distribuição por cabo18.

5.33 Na exposição de motivos do respetivo projeto de lei explicitou-se ainda que “nada se altera na natureza especial do Canal Parlamento”, sendo que “esse carácter e estatuto especial determinam que ao Canal Parlamento não se aplique a lei da televisão”.

5.34 A ANACOM entende ainda que, tendo em vista garantir o cumprimento de uma obrigação de não discriminação, a mesma deve ser acompanhada pela imposição de obrigações de transparência e de separação de contas.

Transparência

5.35 Segundo o artigo 67.º da LCE, a ARN pode exigir a publicação, de forma adequada, das informações relativas à oferta de acesso e interligação do operador com PMS, nomeadamente, informações contabilísticas, especificações técnicas, características da rede, termos e condições de oferta e utilização, incluindo preços.

5.36 A transparência é, além do mais, um complemento natural para a obrigação de não discriminação, uma vez que a capacidade de identificação de comportamentos com possíveis efeitos nefastos, através do uso de práticas discriminatórias, depende da possibilidade de detetar tal comportamento. Ou seja, não impondo a obrigação de transparência, estar-se-ia a comprometer a efetividade da obrigação de não discriminação. Também o ERG defende19 que, sendo particularmente complexo para uma ARN controlar a qualidade dos serviços prestados, quando se impõe uma obrigação de não discriminação poderá fazer todo o sentido apoiar esta obrigação numa obrigação de transparência.

5.37 De acordo com o artigo 68.º da LCE, a ARN pode determinar, nomeadamente às empresas que estejam também sujeitas a obrigações de não discriminação, a publicação de ofertas de referência de acesso, incluindo o modo de publicitação. Esta Autoridade considera que, de momento, não existe necessidade de publicação de qualquer oferta de referência relativa aos serviços grossistas de teledifusão digital terrestre.

5.38 Note-se que, anteriormente, no âmbito da teledifusão analógica terrestre, este tipo de instrumento não foi necessário e, adicionalmente, no caso da teledifusão digital terrestre, o direito de utilização de frequências atribuído pela ANACOM contém as especificações que, de acordo com a informação disponível e no momento atual, são necessárias para assegurar a transparência adequada relativamente às condições básicas de prestação dos serviços.

5.39 Considera-se nomeadamente que, caso um operador pretenda obter informações mais detalhadas sobre uma determinada matéria, poderá obter essa informação junto da MEO. Por último, caso as informações solicitadas por um operador de televisão não sejam prestadas de forma e num prazo adequados pode esse operador solicitar a intervenção da ANACOM, o qual poderá garantir a prestação das informações em causa nos moldes adequados ao abrigo da obrigação de transparência imposta neste documento.

5.40 De qualquer modo, a MEO deve informar a ANACOM de todo e qualquer acordo com influência no âmbito do mercado em análise que estabelecer com os operadores televisivos, no prazo de 10 dias úteis após a sua celebração.

Controlo de preços e contabilização de custos

5.41 À luz da LCE, a ANACOM deve assegurar que os mecanismos de amortização de custos ou as metodologias de fixação de preços promovem a eficiência e a concorrência sustentável e maximizem os benefícios para o consumidor, podendo também ter em conta nesta matéria os preços disponíveis nos mercados concorrenciais comparáveis.

5.42 O artigo 74.º da mesma lei permite à ARN impor obrigações de amortização de custos e controlo de preços, incluindo a obrigação de orientação dos preços para os custos e a obrigação de adotar sistemas de contabilização de custos, para fins de oferta de tipos específicos de acesso ou interligação, quando uma potencial ausência de concorrência efetiva origine a manutenção de preços a um nível excessivamente elevado ou a aplicação de compressão de margens em detrimento dos utilizadores finais.

5.43 Assinala-se que nos termos do DUF ICP- ANACOM n.º 6/2008 a MEO está obrigada a cumprir todos os compromissos constantes da proposta apresentada ao concurso público relativo ao MUX A e que, em particular, “de acordo com o cenário variante que apresentou (…) pode (...) cobrar aos operadores de televisão um preço médio anual de disponibilização do serviço por Mbit/s, nos primeiros dez anos a contar da data de emissão do presente título, nos termos da proposta apresentada”, aditando que estes “preços médios anuais de disponibilização do serviço por Mbit/s, referidos no cenário variante (…), podem ser revistos mediante acordo com os operadores de televisão e devem ser comunicados ao ICP ANACOM20.

5.44 A MEO, na proposta do cenário variante, apresentou um preço médio anual de disponibilização do MUX A por Mbps, para os primeiros 10 anos, de 746,4 milhares de euros por Mbps, sendo que caso se tivesse em referência os anos de 2011 a 2018, corresponderia a 885,1 milhares de euros por Mbps. No âmbito dessa proposta apresentou também memorandos de entendimento celebrados com cada um dos operadores de televisão onde foi acordado um preço anual por canal.

5.45 No decorrer de 2012 e 2013 a MEO celebrou contratos de prestação do serviço de TDT com cada um dos operadores de televisão, nos quais está definido um preço anual por canal.

5.46 No entanto, apesar de o preço (médio) anual por Mbps estar previsto no DUF ICP-ANACOM n.º 6/2008 e de existirem contratos celebrados com cada um dos operadores de televisão, foi solicitada, por um lado, a intervenção da ANACOM para que, no exercício das suas competências legais, procedesse à mediação na determinação do preço da TDT e, por outro lado, iniciasse e desenvolvesse o processo que permita impor à MEO o princípio da orientação dos preços para os custos na formação do preço que presta21.

5.47 Sem prejuízo do suprarreferido em relação à condição prevista no DUF

ICP-ANACOM n.º 6/2008 sobre o preço, na ausência de uma obrigação de orientação dos preços para os custos imposta ao abrigo de uma análise de mercado, a ANACOM só pode intervir nos preços ao abrigo do artigo 43.º, n.º 3 da LCE caso se conclua pela inexistência ou invalidade dos acordos celebrados, ou se justifique, excecionalmente, à luz de um juízo de proporcionalidade face aos prejuízos para o interesse público e os objetivos regulatórios, a intervenção do regulador nos preços acordados.

5.48 O preço que decorre de uma intervenção ao abrigo do artigo 43.º, n.º 3, da LCE é uma “remuneração adequada” e que decorre de uma análise casuística e verificados os pressupostos supra.

5.49 A imposição de uma obrigação ex-ante de orientação dos preços para os custos é assim necessária e desejável para que se possa ter uma capacidade de intervenção mais ampla, a qual será relevante, por exemplo, num cenário de redução de custos face aos previstos na proposta ou em que a capacidade não utilizada se altere, situação essa que, caso a ANACOM tenha capacidade limitada de intervenção, poderá resultar em margens excessivas para a MEO, incompatíveis com as que se verificam em mercados concorrenciais.

5.50 De facto, atendendo a que o mercado grossista de teledifusão digital terrestre gratuito para os utilizadores finais se carateriza pela ausência de uma concorrência efetiva, quer em termos atuais, quer em termos prospetivos, e não obstante no DUF ICP-ANACOM n.º 6/2008 se considerar que a MEO pode cobrar aos operadores televisivos um preço médio anual de disponibilização do serviço por Mbps, nos primeiros dez anos a contar da data de emissão do título de utilização de frequências nos termos das propostas apresentadas, na ausência de concorrência efetiva, o operador dominante tem poucos incentivos em reduzir os custos de prestação dos serviços grossistas e operar de forma eficiente, uma vez que esses custos elevados poderão ser transferidos através de preços excessivos aos clientes grossistas que não têm alternativa de escolha em mercados não concorrenciais.

5.51 E caso os pressupostos assumidos inicialmente pela MEO, na proposta que apresentou a concurso, tenham uma evolução no sentido da sua margem ser superior ao inicialmente previsto, aquela empresa não terá quaisquer incentivos para reduzir os preços, uma vez que não sofre qualquer concorrência neste mercado.

5.52 Assim, dada a inexistência de concorrência atual e prospetiva, no período em análise, o objetivo de regulação de preços deve ser disponibilizar aos operadores concorrentes o acesso grossista a preços que seriam praticados caso o mercado fosse competitivo.

5.53 Deste modo, a ANACOM entende que é necessário e proporcional a imposição de uma obrigação de orientação dos preços para os custos.

5.54 Uma vez que os custos do serviço de TDT variam de ano para ano, principalmente em resultado de alterações no imobilizado, quer por via de investimentos adicionais que naturalmente contribuem para o aumento dos custos, quer por via da redução do valor líquido do imobilizado, que se traduz numa redução do custo do capital, havendo também investimentos passados que vão sendo totalmente amortizados, justifica-se avaliar anualmente a necessidade de rever o preço que a MEO irá cobrar aos operadores de televisão pelo serviço de TDT.

5.55 Para esse efeito a MEO deve, anualmente, conjuntamente com os dados do SCA, remeter à ANACOM a demonstração de resultados do produto TDT, com vista a avaliar se o preço deste serviço está orientado aos custos e, caso não esteja, alinhá-lo com os respetivos custos.

Separação de contas

5.56 Tal como acontece com a obrigação de transparência, a obrigação de separação de contas é essencial para garantir o cumprimento e a efetividade das obrigações de não discriminação e de controlo de preços e contabilização de custos, permitindo à ANACOM monitorizar corretamente o cumprimento das obrigações associadas aos preços e custos da empresa com PMS.

5.57 Esta é uma medida objetivamente justificável, dada a necessidade de garantir a não discriminação e impedir a subsidiação cruzada, e uma medida proporcional, na medida em que apenas é exigida a disponibilização de informação com um detalhe que permita concretizar os objetivos de verificação de outras obrigações.

5.58 Identifica-se, nomeadamente, que a inexistência da obrigação de separação de contas conduziria a que esta Autoridade tivesse dificuldade em monitorizar corretamente o cumprimento das obrigações associadas aos preços e custos da empresa com PMS e, consequentemente, dificultasse de forma significativa a identificação de situações de subsidiação cruzada22.

5.59 Conclui-se que a obrigação de separação de contas deve ser imposta, nomeadamente no âmbito do sistema de custeio da MEO (sistema de contabilidade analítica), por forma a assegurar que existe uma monitorização efetiva das obrigações de não discriminação e de controlo de preços e contabilização de custos. Deste modo, a demonstração de resultados do produto relativo à teledifusão digital terrestre deve ser integrada, como produto regulado e autonomizado, no sistema de contabilidade analítica (SCA) da MEO, cujos resultados são regularmente remetidos à ANACOM.

5.60 Trata-se de uma disposição proporcional, na medida em que apenas é exigida a disponibilização de informação com um detalhe que permita concretizar os objetivos de verificação de outras obrigações.

Reporte financeiro

5.61 Para que a ANACOM verifique o cumprimento das obrigações anteriormente definidas, nomeadamente as obrigações de transparência, não discriminação, separação de contas e contabilização de custos, e de acordo com o n.º 3 do artigo 71.º da LCE, o operador com PMS deverá disponibilizar os seus registos contabilísticos incluindo os dados sobre receitas provenientes de terceiros. Em caso contrário, estar-se-ia a comprometer a efetividade das mesmas obrigações.

5.62 Entende-se que estes registos contabilísticos constituem o sistema de contabilidade analítica que deve ser remetido nos termos definidos em sede própria. Mantém-se também o entendimento de que a imposição da obrigação de reporte financeiro é necessária, proporcional e adequada.

Notas
nt_title
 
1 Cf. Linhas de Orientação §21 e §114 e artigos 56.º, e) e 59.º, n.º 4 da LCE. As obrigações que existiam recaíam sobre o mercado de teledifusão analógica terrestre, as quais caducaram com o switch off.
2 Disponível em http://www.erg.eu.int/doc/meeting/erg_06_33_remedies_common_position_june_06.pdf.
3 Disponível em Definição das obrigações de cobertura terrestre e alteração do DUF TDT (MUX A)https://www.anacom.pt/render.jsp?categoryId=383284.
4 Trata-se de uma identificação não exaustiva.
5 Em rigor, esta reserva, com a configuração dada pelo Regulamento do Concurso aprovado pela portaria referida, já se extinguiu. De qualquer forma a MEO mantém-se obrigada a reservar esta capacidade, cabendo ao Governo a decisão sobre a matéria.
6 No entender da ANACOM caducou a obrigatoriedade de reserva de capacidade por parte da MEO para o canal HD partilhado, nos termos fixados no DUF ICP-ANACOM n.º 6/2008.
7 Existem outras especificações relacionadas com a capacidade total mínima a reservar para a difusão (possibilidade de reforço e revisão bienal dos débitos binários estabelecidos).
8 Conforme referido atrás, no entender da ANACOM caducou a obrigatoriedade de reserva de capacidade por parte da MEO para o canal HD partilhado, nos termos fixados no DUF ICP-ANACOM n.º 6/2008.
9 Designadamente através de sistemas multicanal (tais como do tipo AC-3 Dolby Digital 5.1 ou Dolby Digital Plus) com retro compatibilidade.
10 Existe também a obrigação de providenciar a cobertura portátil interior dos locais indicados na proposta.
11 Garantindo adicionalmente que, no final de 2009, 78 por cento da população já se encontre coberta pela radiodifusão digital terrestre.
12 Disposto no n.º 16 do DUF ICP-ANACOM n.º 06/2008.
13 Existem contudo alguns níveis de qualidade de serviço definidos no âmbito do concurso relativo ao MUX A e contratualizados com os operadores de televisão.
14 Embora nos instrumentos do concurso não esteja expressamente fixada uma obrigação de não discriminação do titular do direito de utilização de frequências, no âmbito do Regulamento do Concurso para a atribuição do direito de utilização de frequências para o serviços de radiodifusão televisiva digital terrestre o princípio da não discriminação está implícito (i) na obrigação de reserva de capacidade e transporte, imposta ao titular do direito de utilização de frequências, quanto aos operadores de televisão licenciados ou concessionados (RTP1, RTP2, SIC e TVI), bem como (ii) na previsão de um preço médio anual de disponibilização do serviço por Mbit/s, como critério de apreciação das candidaturas. A não discriminação em relação a outros operadores de televisão concorrentes está prevista no âmbito dos contratos celebrados, estando também implícita no artigo 43.º da LCE mas apenas em relação aos serviços de programas televisivos que sejam beneficiários de obrigações de transporte (must-carry).
15 Preços esses referidos no cenário variante e podendo ser revistos mediante acordo com os operadores de televisão e devendo os preços revistos ser comunicados à ANACOM.
16 A próxima análise de mercado será desencadeada logo que: (1) ocorra um facto que altere significativamente as condições de concorrência no mercado ou (2) logo que a Recomendação seja revista no que diz respeito a estes mercados.
17 O artigo 66.º prevê as competências da ARN no âmbito da imposição, manutenção, alteração ou supressão de obrigações. O artigo 70.º descreve, em particular, a obrigação de não discriminação.
18 Note-se que também a ERC, no âmbito das suas competências, não especificou o Canal Parlamento como beneficiário de obrigações de transporte.
19 Revised ERG Common Position on the approach to appropriate remedies in the ECNS regulatory framework ("Remedies" document).
20 Cláusula 16.º, n.ºs 1 e 4 do DUF.
21 No âmbito do já referido pedido da RTP de 10 de setembro de 2013, ao qual a SIC e a TVI aderiram, objeto de deliberações da ANACOM de 14 de março de 2014 e de 2 de maio de 2014.
22 Uma eventual supressão da obrigação de separação de contas poderia implicar que os prejuízos acima identificados (aquando da ponderação das obrigações de não discriminação e de controlo de preços e contabilização de custos) afetassem os mercados relevantes.