Revogação do direito de utilização de frequências da Optimus para a exploração de sistemas de acesso fixo via rádio (FWA)


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Revogação do direito de utilização de frequências e da licença radioelétrica atribuídos à Optimus - Comunicações, S. A. para exploração do sistema de acesso fixo via rádio (FWA)

 
1. O pedido

Por carta recebida no ICP-ANACOM em 25 de setembro de 2012, a Optimus - Comunicações, S. A. (doravante Optimus) expõe e comunica, em síntese, o seguinte

  • a empresa tem vindo a adaptar a sua oferta e a rede que a sustenta de modo a responder adequadamente à evolução das necessidades dos clientes, incluindo avultados investimentos no desenvolvimento de redes de acesso de fibra ótica que permitem colocar à disposição dos clientes finais serviços com muito maior largura de banda, menor custo por bit transportado e melhores níveis de qualidade de serviço do que as redes ponto-multiponto FWA;
     
  • a rede FWA não tem capacidade para dar resposta aos atuais requisitos dos serviços pretendidos pelos clientes, maioritariamente redes IP com velocidades de transferência elevadas, e também não apresenta vantagens no âmbito da conetividade e capacidade da rede de transporte da Optimus (mobile backhauling). Acresce que a modernização da rede FWA exigiria elevados investimentos que não se justificam face ao desempenho acrescido das redes de fibra ótica e ao investimento que tem sido direcionado para o seu desenvolvimento;
     
  • a empresa tem vindo a migrar as ofertas suportadas em FWA para tecnologias alternativas continuando a corresponder aos requisitos dos clientes, razão pela qual, o número de clientes cujos serviços são suportados em FWA tem vindo a decrescer sucessivamente pelo que apenas um número muito reduzido ainda dispõe destes serviços.
     
  • e em estreita colaboração com os seus clientes finais, pretende concluir a migração dos clientes suportados em FWA para soluções alternativas até ao final do ano de 2012.

Com base nestes pressupostos, a Optimus afirma que, após 31 de dezembro de 2012, não pretende continuar a utilizar as frequências cujos direitos de utilização lhe foram atribuídos para exploração do sistema FWA, pelo que vem:

  • Renunciar, com efeitos a 31 de dezembro de 2012, aos direitos de utilização de frequências relativos:

a. Ao bloco de 2x56 MHz correspondentes às frequências 24,773 GHz - 24,829 GHz e 25,781 GHz - 25,837 GHz (zonas geográficas 1 e 2);

b. Ao bloco de 2x28 MHz, correspondente às frequências 24,801 GHz - 24,829 GHz e 25,809 GHz - 25,837 GHz (zona geográfica 3).

  • Requerer, em consequência, com efeitos a 31 de dezembro de 2012 e sem qualquer condição – que não seja a dos atos de revogação apenas produzirem os seus efeitos no dia 31 de dezembro de 2012 - a revogação:

a. Do ato de atribuição do direito de utilização de frequências para exploração de sistemas de acesso fixo via rádio (FWA) detido pela Optimus;   

b. Do título que consubstancia aquele direito de utilização (DUF ICP-ANACOM n.º 08/2006);

c. Da licença radioelétrica n.º 504240 atribuída à Optimus.

  • Informar, para os efeitos previstos no artigo 21.º, n.º 7 da Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro com a redação conferida pela Lei n.º 5/2011, de 13 de setembro, que irá cessar a sua atividade enquanto operador FWA até 31 de dezembro de 2012.

2. Enquadramento  

2.1. Títulos atribuídos à Optimus para exploração do sistema FWA

Por despacho do Ministro do Equipamento Social (MEPAT), de 19 de novembro de 1999, proferido nos termos do n.º 2 do artigo 17.º do Regulamento anexo à Portaria n.º 465-B/99, de 25 de junho, e na sequência do concurso público para atribuição de licenças, de âmbito nacional, para a utilização de frequências para o Acesso Fixo Via Rádio (FWA), aberto pelo Despacho MEPAT de 28 de junho de 1999, foram atribuídas à então Novis Telecom as Licenças n.º ICP – 02/99-FWA e ICP - 04/99-FWA.

Posteriormente, a Portaria n.º 1062/2004, de 25 de agosto, aprovou a alteração do modelo de exploração dos sistemas FWA, introduzindo um modelo de cobertura por zonas geográficas, a permissão de utilização das frequências na rede de transmissão e a reformulação do sistema de taxas radioelétricas.

Nos termos da citada portaria, competia ao ICP-ANACOM a definição do modelo de utilização por zonas das faixas de frequências FWA atribuídas, bem como a adaptação dos respetivos títulos habilitantes.

A Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro (Lei das Comunicações Eletrónicas – LCE), previa também, no seu artigo 121.º, que as empresas conservavam os direitos de utilização das frequências, atribuídos antes da sua publicação, até ao termo do prazo fixado no respetivo título de atribuição, mantendo-se aplicáveis todas as obrigações assumidas pelas empresas licenciadas em concursos realizados antes da sua publicação, bem como, na parte relevante, os respetivos instrumentos de concurso.

Cabia, no entanto, ao ICP-ANACOM promover as alterações e adaptações necessárias às licenças emitidas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 381-A/97, de 30 de dezembro, pelo que o ICP-ANACOM emitiu, em 23 de novembro de 2006, o título reconfigurado do direito de utilização de frequências para a exploração de sistemas de acesso fixo via rádio (FWA) que havia sido atribuído à Novis Telecom.

Assim, ao abrigo do direito de utilização de frequências ICP-ANACOM n.º 08/2006 - FWA, a Novis Telecom manteve o direito à utilização de um bloco de 2 x 56 MHz, correspondente às frequências 24,773 GHz - 24,829 GHz e 25,781 GHz - 25,837 GHz, para as zonas geográficas 1 e 2, um bloco de 2 x 28 MHz, correspondente às frequências 24,801 GHz - 24,829 GHz e 25,809 GHz - 25,837 GHz, para a zona geográfica 3 e de um bloco de 2 x 28 MHz, correspondente às frequências 3633 MHz - 3661 MHz e 3733 MHz - 3761 MHz, para as zonas geográficas 1, 2, 3, 4 e 7. Este direito de utilização de frequências mantém-se válido até 1 de Janeiro de 2015.

Em 26 de março de 2008, mediante averbamento, o referido direito de utilização de frequências foi alterado por força da alteração da designação social da empresa que passou a Sonaecom - Serviços de Comunicações, S. A.

Por deliberação de 7 de janeiro de 2009, tomada na sequência de um pedido de alteração apresentado pela empresa, o direito de utilização de frequências ICP-ANACOM n.º 08/2006 foi novamente alterado atenta a revogação do direito à utilização do bloco de 2x28 MHz, correspondente às frequências 3633-3661 MHz e 3733-3761 MHz, para as zonas geográficas 1, 2, 3, 4 e 7.

A Optimus é ainda titular da licença radioelétrica n.º 504240 para utilização de uma rede pública de radiocomunicações do serviço fixo – ligações ponto-multiponto, válida até 10 de agosto de 2016. 

O requerimento da Optimus ora em análise configura, assim, um pedido de revogação do ato de atribuição do direito de utilização de frequências ICP-ANACOM n.º 08/2006, bem como do ato de atribuição da licença radioelétrica n.º 504240, ou seja, a revogação de atos administrativos válidos.

2.2. Revogação de atos administrativos válidos - competência do ICP-ANACOM para a revogação e interessados

É, assim, à luz do regime da revogação dos atos administrativos válidos, previsto no Código do Procedimento Administrativo (CPA), que o presente pedido deve ser analisado. Esta figura consiste numa «decisão administrativa dirigida à cessação dos efeitos de outra decisão administrativa prévia, por se entender que os efeitos desta não são convenientes, não representam uma maneira adequada de prosseguir o interesse público em causa (…)»1.

Ora, o CPA prevê no seu artigo 140.º que os atos administrativos são livremente revogáveis, exceto i) quando a sua irrevogabilidade resultar de vinculação legal, ii) forem constitutivos de direitos ou iii) deles resultem para a administração obrigações legais ou direitos irrenunciáveis. No caso de os atos serem constitutivos de direitos, como no presente caso, estes só podem ser revogados na parte em que forem desfavoráveis aos interesses dos destinatários ou quando todos os interessados derem a sua concordância à revogação e não se trate de bens indisponíveis.

Assim, importa verificar em primeiro lugar qual é a entidade competente para proceder à revogação do ato.

Nos termos do n.º 1 do artigo 142.º do CPA, na ausência de disposição especial que atribua a entidade diversa competência para o efeito, é competente para a revogação de um ato administrativo o seu autor.

No atual regime legal2, a atribuição de direitos de utilização de frequências compete ao ICP-ANACOM (vd. Artigo 19.º, n.º 3 da LCE), bem como a sua renovação (cfr. artigo 33.º da LCE).

Nestes termos, cabe ao ICP-ANACOM o poder de renovar os direitos de utilização de frequências, mesmo nos casos em que essa atribuição é precedida de procedimento de seleção, nomeadamente concurso, em que as regras de atribuição são da competência do membro do Governo responsável na área das comunicações. E, assim sendo, cabe também ao ICP-ANACOM o poder de revogar o ato atributivo desse direito.

No âmbito do regime aplicável ao licenciamento de redes e estações de radiocomunicações, estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 151-A/2000, de 20 de julho, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 264/2009, de 28 de setembro, compete igualmente ao ICP-ANACOM a atribuição (artigo 5.º), a alteração (artigo 16.º) e a revogação (artigo 17.º) das correspondentes licenças radioelétricas, sendo que neste último caso, o processo pode ser desencadeado por iniciativa do titular das licenças.

A razão pela qual a lei reconheceu o poder revogatório ao autor do ato administrativo reside na ideia de que a competência revogatória é um mero desenvolvimento da competência dispositiva ou primária. Conclui-se, portanto, que a competência para revogar os atos em causa pertence ao ICP-ANACOM.

No caso vertente verifica-se também que o pedido de revogação é da iniciativa da Optimus, única interessada no sentido implícito do artigo 140.º do CPA, ou seja, enquanto titular dos direitos ou interesses legalmente protegidos cuja concordância é necessária para a revogação do ato.

Neste enquadramento, importa ter ainda em conta que os atos de cuja revogação ora se trata (os de atribuição de direitos de utilização de frequências e de licenças radioelétricas) se inserem na designada categoria de atos favoráveis. Com efeito, está em causa, em primeira linha, a atribuição de uma vantagem, que se traduz na atribuição de um direito de exploração de um determinado recurso, que o particular pretende obter no seu interesse e para desenvolvimento de uma atividade económica.

Assim, quando confrontado com um pedido de revogação de um ato que atribui uma vantagem a um particular – pedido esse que é obviamente fundado no interesse e nas motivações do respetivo titular – compete ao ICP-ANACOM avaliar se o interesse público, cuja realização estava também associada ao ato favorável, ficará ou não prejudicado pelo deferimento da pretensão do particular.

3. Análise do pedido

Como se sabe, no sector das comunicações eletrónicas, a LCE, em transposição do enquadramento definido no plano comunitário, prevê que «é garantida a liberdade de oferta de redes e serviços de comunicações eletrónicas» (artigo 19.º, n.º 1).

Não resulta, contudo, deste regime legal a obrigação de permanência na atividade (na oferta de redes e serviços de comunicações eletrónicas), por quem nela não quer permanecer, sem prejuízo, naturalmente, do cumprimento de obrigações de salvaguarda, designadamente dos interesses dos consumidores ou de outros agentes económicos, que, a este respeito, a Lei ou o Regulador possam determinar.

Ou seja, sem prejuízo das disposições normativas que, por força da escassez de recursos envolvidos ou da natureza do serviço, nomeadamente de serviço universal, possam impor condições de acesso e utilização, não resulta do ordenamento jurídico vigente uma obrigação de permanência que, a existir em termos absolutos, poderia eventualmente constituir a negação do conceito de liberdade de iniciativa privada.

Assim, no caso em análise, não pode deixar de se considerar que assiste à Optimus a liberdade de não querer desenvolver a atividade para a qual lhe foi atribuído o direito de utilização de frequências, tendo presente, como já acima explicitado, que o ato em causa – de atribuição de direitos de utilização de frequências – se insere na designada categoria de atos administrativos favoráveis. Naturalmente que importará, caso a caso, aferir das condições que sejam aplicáveis, em cada situação concreta, perante a intenção de abandono de atividade que estiver em causa.

No que se refere em concreto à cessação da prestação do serviço FWA importa ter presente o relatório sobre a evolução do serviço fixo, bem como as necessidades de espectro, aprovado em março passado, pelo Grupo de Trabalho de Engenharia do Espectro (WGSE) da CEPT.

Neste relatório e no que em particular se refere à faixa dos 24,5-26,5 GHz, o Grupo concluiu que, de um modo geral, a utilização da faixa não teve um aumento significativo, face a outras faixas de frequências, e que tem tido mais relevo para ligações ponto-ponto do que para ligações ponto-multiponto (sistemas FWA).

A nível internacional, verifica-se igualmente que os investimentos em ligações ponto-multiponto não têm evoluído na mesma proporção que para ligações ponto-ponto, denotando-se um evidente desinvestimento generalizado ao nível das tecnologias e serviços proporcionados por este tipo de aplicação.

Ora, na sequência destas dificuldades ao nível de tecnologias/serviços e do investimento necessário para manter a rede operacional, parece ser de considerar natural que a Optimus procure alternativas tecnológicas para prestação dos serviços que tinha em vista com o FWA.

Assim, com base no vindo a expor, considera-se que, em termos de gestão de espectro, nomeadamente atendendo ao princípio de utilização efetiva e eficiente do espectro, nada obsta à pretensão da empresa.

E igualmente se entende que nada há a obstar ao pedido de revogação da licença radioelétrica n.º 504240 atribuída à Optimus, tendo ainda presente que, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 151-A/2000, de 20 de julho, as licenças podem ser revogadas a pedido do titular.

Por outro lado, de acordo com a informação disponível, verifica-se que o número de assinantes de FWA reportados pela Optimus tem vindo sempre a diminuir e que, em sentido oposto, o investimento da empresa em redes de fibra ótica tem vindo a aumentar, sentindo-se o correspondente reflexo nos quilómetros de fibra ótica instalada na sua rede de acesso/distribuição.

Na análise do pedido releva ainda o facto de a Optimus informar que tem vindo a migrar as ofertas suportadas em FWA para tecnologias alternativas, continuando a corresponder aos requisitos dos clientes, e que, em estreita colaboração com os mesmos, pretende concluir a migração dos clientes suportados em FWA para soluções alternativas até ao final do ano de 2012. Com esta conduta, entende-se que a Optimus salvaguarda os utilizadores dos seus serviços, os quais têm direito de serem informados, com uma antecedência mínima de 15 dias, da cessação da oferta (tal como previsto no artigo 39.º, n.º 1, alínea c) da LCE e no seu direito de utilização de frequências), cumprindo com o dever de em paralelo dar conta desse facto ao ICP-ANACOM (tal como estipula o n.º 4 do artigo 39.º da LCE).

E se, em síntese, se atender a que (i) o número de assinantes de FWA reportados pela Optimus tem vindo a diminuir, (ii) a rede de fibra ótica da empresa aumentou e que (iii) existem no mercado diversos serviços/ofertas alternativas aos sistemas FWA, conclui-se que o deferimento da pretensão da Optimus em nada prejudica o interesse público subjacente à atribuição destas frequências.

Finalmente e face ao acima exposto considera-se que a decisão de deferimento do pedido da Optimus (de revogação do direito de utilização de frequências que lhe foi atribuído) não terá um impacto significativo no mercado que, como tal, imponha a promoção do procedimento geral de consulta nos termos previstos no artigo 8.º da LCE.

Acresce que os elementos constantes do presente procedimento conduzem a uma decisão que é favorável à Optimus e que vai no sentido do requerido pela mesma, pelo que igualmente se entende que pode ser dispensada a audiência prévia da mesma, ao abrigo do que se prevê na alínea b) do n.º 2 do artigo 103.º do Código do Procedimento Administrativo3.

4. Deliberação

Face ao exposto, o Conselho de Administração do ICP-ANACOM, no âmbito das atribuições previstas no artigo 6.º, n.º 1, al. c) dos seus Estatutos, publicados em anexo ao Decreto-Lei n.º 309/2001, de 7 de dezembro, na prossecução dos objetivos de regulação fixados no artigo 5.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, alínea d), ao abrigo do disposto nos artigos 15.º, 19.º, n.º 3 e 33.º todos da LCE, e no exercício das competências que lhe são cometidas pelo artigo 26.º, alínea l) dos seus Estatutos, bem como pelo artigo 140.º, n.º 2, alínea b) do CPA, delibera:

1. Revogar o ato de atribuição do direito de utilização de frequências para a exploração de sistemas de acesso fixo via rádio (FWA) detido pela Optimus - Comunicações, S. A. e, consequentemente, o título que consubstancia o direito de utilização que lhe foi atribuído (ICP-ANACOM n.º 08/2006 - FWA), com efeitos a 31 de dezembro de 2012.

2. Revogar a licença radioeléctrica n.º 504240 de que é titular a Optimus - Comunicações, S. A., ao abrigo e nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 151-A/2000, de 20 de julho.

3. Dispensar a audiência prévia da Optimus - Comunicações, S. A., nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 103.º do Código do Procedimento Administrativo.

Notas
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1 In Código do Procedimento Administrativo comentado, 2.ª Ed., Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, Secção IV, II., pág. 667).
2 Decorrente da Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro (LCE), alterada e republicada pela Lei n.º 51/2011, de 13 de setembro.
3 No qual se prevê que o órgão instrutor pode dispensar a audiência dos interessados se os elementos constantes do procedimento conduzirem a uma decisão favorável aos interessados.