Pedido da Vodafone de suspensão de eficácia da decisão da ANACOM de 02.08.2018 referente ao pedido de intervenção para resolução administrativa de litígios - incumprimento de procedimentos de instalação de drops de cliente no âmbito da ORAP


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Decisão sobre o pedido de suspensão de eficácia da decisão referente ao pedido de intervenção para resolução administrativa de litígios - incumprimento de procedimentos de instalação de drops de cliente no âmbito da ORAP, aprovada por deliberação da ANACOM de 02.08.2018

I. Enquadramento

No âmbito de um pedido de intervenção da MEO - Serviços de Comunicações e Multimédia, S.A. (MEO), ao abrigo do procedimento de resolução administrativa de litígios previsto no artigo 10.º da Lei das Comunicações Eletrónicas (LCE)1, a ANACOM, através de decisão final de 02.08.2018, com base nos factos e fundamentos nela expostos, determinou à Vodafone Portugal - Comunicações Pessoais, S.A. (Vodafone ou Requerente) o cumprimento imediato das regras previstas na versão 3.1 da Oferta de Referência para Acesso a Postes (ORAP), em vigor, no que diz respeito aos procedimentos relativos à instalação de drops de cliente, cessando a prática atual, devendo a mesma, em consequência:

a) Apresentar à MEO os pedidos de instalação de drop de cliente ao abrigo do serviço de intervenção;

b) Informar a MEO sobre todos os drops de cliente que instalou desde agosto de 2017 até ao presente, identificando-os corretamente em cadastro; e

c) Proceder ao pagamento dos montantes referentes à ocupação dos postes da MEO associados aos drops de cliente.

Inconformada com esta decisão, a Vodafone apresentou, em 27.08.2018, uma reclamação administrativa, ao abrigo do disposto no artigo 184.º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo (CPA), através da qual requer a revogação ou anulação da supra referida decisão da ANACOM de 02.08.2018, bem como a declaração de que a Vodafone não se encontra obrigada (i) a informar a MEO previamente à instalação de drops de clientes, (ii) a entregar à MEO o cadastro de cabos e equipamentos e (iii) a pagar à MEO a quantia de 1,25€ por cada drop instalado.

Posteriormente, em 31.08.2018, a Vodafone apresentou, ao abrigo do disposto no artigo 189.º, n.os 2 e 4 do CPA, requerimento em que pede a atribuição de efeito suspensivo à mencionada reclamação, e, bem assim, a determinação da suspensão de todos os efeitos deste ato até que a reclamação seja decidida.

É este pedido que, seguidamente, se descreve e aprecia.

II. Pedido da Vodafone: atribuição de efeito suspensivo

A Vodafone sustenta o pedido de suspensão da execução da decisão da ANACOM de 02.08.2018, na verificação, cumulativa, dos dois requisitos legais previstos no artigo 189.º do CPA, alegando que «afigura-se inquestionável que a execução imediata da decisão reclamada “causa prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação” à Vodafone e que, em contrapartida, a sua suspensão provisória “não caus[a] prejuízo de maior gravidade para o interesse público”.» (vd. ponto 14).

No que respeita ao primeiro requisito legal (prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação), a Vodafone afirma que “é manifesto que a execução imediata da decisão da ANACOM poderia provocar danos avultadíssimos (e de difícil reparação)” que diz totalizarem o montante global de [IIC] [FIC], dos quais [IIC] [FIC] corresponderiam “ao parque (número) de drops instalados pela Vodafone, assim identificado pela MEO no seu pedido de resolução de litígios”, e [IIC] [FIC] corresponderiam ao “valor que a MEO tem por expetativa obter relativamente aos drops que alega que a Vodafone terá entretanto instalado cada mês e que (…) corresponderá a um montante devido por uma média mensal de 1.711 drops instalados”.

Mais afirma que a execução da decisão da ANACOM implicaria, não só um “imediato (…) desapossamento de uma quantia muito significativa de cerca de 700 mil euros, sem qualquer título que justifique esse pagamento ou legitime o seu recebimento por parte da MEO”, como também o possível “prolongamento, por vários meses do hiato temporal em que a Vodafone se veria privada de um montante bastante elevado, não podendo dar-lhe outra aplicação”, atentas as potenciais dificuldades que defende poder vir a ter para obter um reembolso por parte da MEO (das quantias que indevidamente fossem, agora, pagas) caso viesse a reclamação que apresentou viesse a merecer provimento.

Neste sentido, a Vodafone considera que existe “um risco sério e plausível da verificação de um dano considerável, originado unicamente pela execução imediata da decisão reclamada”, dando nota da carta da MEO, datada de 16.08.2018, que a interpelou ao cumprimento da decisão da ANACOM no prazo de 10 (dez) dias úteis.

Na linha do alegado na reclamação, a Vodafone reitera que o valor unitário de 1,25 € por mês por “ocupação de uma fixação por um cabo em poste (…) não resulta (…) do ponto 7.3 da Tabela 9, que apenas incide sobre o serviço de acesso e instalação de construção de rede de acesso, o qual é distinto do serviço de intervenção, que se destina a situação de avaria e é totalmente distinto do serviço de instalação de drop de cliente (que, uma vez mais se reitera, não está expressa e especificamente contemplado na ORAP 3.1.)”. E, ainda que assim não fosse, considera - mais uma vez reiterando o argumentário da reclamação - que tal valor “está completamente desfasado da realidade e é absolutamente desproporcional.

Assim, declara que, ainda que se venha a entender que a Vodafone tenha que pagar à MEO pelos drops de cliente instalados, o valor a pagar nunca será no montante unitário de 1,25 € / mês por “ocupação de uma fixação por um cabo em Poste”. Logo, entende que, a ter que pagar algum valor à MEO, nunca seria o “avultado” valor mencionado supra.

A empresa afirma, ainda, para fundamentar o pedido em análise, que se vier “eventualmente a ser forçada a pagar à MEO o montante por esta peticionado, no caso de procedência da reclamação (…) a Vodafone teria depois de procurar ser reembolsada junto da MEO pelo excesso indevidamente recebido por esta - com as expectáveis dificuldades”.

Para a Vodafone, sendo controvertida a existência de uma obrigação de pagamento (e incertos os respetivos montantes) e estando pendente a reclamação administrativa, não há nada, na sua opinião, que justifique que a decisão da ANACOM de 02.08.2018 tenha de ser executada de imediato e que não se possa aguardar até que a ANACOM a reveja e se pronuncie, em termos definitivos, sobre as pretensões submetidas à sua apreciação.

Por conseguinte, entende que “os prejuízos sofridos pela Vodafone ao poder ver-se de imediato privada de uma quantia tão avultada (e as dificuldades previsivelmente enfrentadas quando, no futuro, pretender reaver da MEO as quantias a quem tem direito) são muitíssimo superiores aos (nulos) prejuízos para o interesse público (…)”.

Em aditamento, a respeito da obrigação de identificação correta dos drops instalados no cadastro, a Vodafone afirma que, pese embora exista no Anexo 4 da ORAP um formulário específico (Form. 05), «o mesmo destina-se a informação de cadastro relativa a “construção” e não a cabos de cliente “drop”», pelo que, para dar execução ao mesmo, considera que o formulário em causa careceria de adaptação, o que impediria a execução da decisão reclamada. 

No que respeita ao segundo requisito legal (não causar prejuízo de maior gravidade para o interesse público), a Vodafone afirma que é o interesse público que releva - no seu entender, o interesse da ANACOM na implementação das suas decisões -, não prevendo a lei que nesta ponderação seja incluído o eventual interesse da MEO, enquanto parte no procedimento de resolução administrativa de litígios. Mais: entende que “mesmo que se considerasse que a posição da MEO também deveria ser atendida para este efeito, ainda assim não se vislumbra que a suspensão da execução imediata da decisão da ANACOM lhe provocasse prejuízos (e, muito menos, prejuízos irreparáveis ou superiores aos que a Vodafone sofreria em caso de execução imediata)”.

A Vodafone alega ainda que, na sua perspetiva, “a suspensão dos efeitos da decisão não implicaria riscos para a segurança pública e, consequentemente, não importa também um prejuízo de maior gravidade para o interesse público do que a execução imediata da mesma.”.

E acrescenta que não seria em “alegadas razões de segurança que poderia fundar-se a existência de interesse público relevante e suficientemente ponderoso para se contrapor aos elevadíssimos prejuízos da Vodafone e que justificam a suspensão ora requerida.”, salientando que “o cabo drop tem um diâmetro e um calibre muito inferior ao que é utilizado na construção de rede, pelo que a tensão que o poste sofre pela existência deste cabo é menosprezável e não coloca questões de ordem da estabilidade física do poste.” e que “desconhece-se qualquer situação relacionada com a queda de algum poste da MEO resultante da instalação de um drop de cliente por parte das beneficiárias da ORAP.”.

Considerando que os argumentos apresentados já seriam suficientes para manter o status quo, a Vodafone sublinha ainda que, sem prejuízo da sua expressão pecuniária, o litígio reveste uma relevante feição jus-concorrencial, desde logo, porque a execução da decisão “implicaria também a obrigação de fornecimento, à MEO, de um conjunto de informações comerciais sensíveis por parte da Vodafone, designadamente a data, zona geográfica, concelho, freguesia e local de instalação, que a MEO pode utilizar para efetuar ações de captação/retenção de clientes (…)”.

Neste ponto, faz alusão à posição de “desvantagem competitiva” em que ficaria perante a MEO, tendo em conta as informações que terá de transmitir caso tenha de executar de imediato a decisão de 02.08.2018. Refere a existência de danos para si irreversíveis “já que nunca poderá rasurar-se o facto de a MEO ter tido acesso, em determinado momento, a dados de que nunca deveria ter tido conhecimento”, que “lhe permitem aferir a localização do cliente”.

Vem alegar, uma vez mais, a “situação discriminatória em que a Vodafone se encontra face às suas demais concorrentes no mercado”, por - reitera - “ser a única beneficiária da ORAP que estaria onerada pelo cumprimento das obrigações que a MEO diz resultarem daquela Oferta” (sublinhado nosso). E, nesta base, faz alusão às repercussões negativas que esta situação tem nos consumidores, com “efeitos nefastos ao nível da experiência dos clientes de serviços de comunicações eletrónicas da Vodafone”.

Ademais, declara que, do ponto de vista logístico ou pragmático, a imediata execução da decisão reclamada suscita diversas dificuldades práticas que se refletirão negativamente nos consumidores. Nesta perspetiva, refere que o procedimento previsto na ORAPestá pensado para situações de avarias, sendo totalmente inexequível para pedidos de instalação de drops, desde logo porque prevê que os pedidos de intervenção sejam colocados via telefone”. Nesta sequência, realça “o impacto muito negativo no cumprimento dos agendamentos feitos pela Vodafone com os seus clientes finais”.

E acrescenta que o “cumprimento de uma janela mínima de 8 horas de antecedência, (…) adia, de forma injustificada, os prazos de instalação de clientes da Vodafone e coloca a empresa numa situação de desvantagem competitiva face à MEO e aos demais beneficiários da ORAP”, salientando que apurou que a MEO solicita o acompanhamento de instalação de cabos em cerca de 60% dos casos e, em inúmeras vezes, com reagendamento, o que, na sua opinião, “atrasa a instalação do cliente, e degrada a sua experiência, num período crítico para ativação do mesmo!”.

A Vodafone termina afirmando que, face a tais dificuldades, seria “totalmente contraproducente” dar sequência imediata à decisão da ANACOM sobretudo se - como declara confiar - vier a ser dado provimento à reclamação por si apresentada.

III. Apreciação

III.1. Da admissibilidade do pedido

As impugnações graciosas facultativas - como sucede com a reclamação administrativa apresentada pela Vodafone - não têm, por regra, efeito suspensivo da decisão sobre a qual se reclama.

E é o que se verifica neste caso. A reclamação apresentada pela Vodafone tem apenas efeito devolutivo, dando à entidade competente - a ANACOM - o poder de reapreciar a sua decisão, mas sem suspender automaticamente a respetiva eficácia (vd. o disposto no artigo 189.º, n.º 2 do CPA).

Ora, nos termos do disposto no artigo 189.º, n.º 3 do CPA, “A suspensão da execução pode ser pedida pelos interessados a qualquer momento, devendo a respetiva decisão ser tomada no prazo de cinco dias.”.

Assim sendo, apesar de a reclamação ter sido apresentada em 27.08.2018, não se colocam questões de extemporaneidade do pedido de suspensão apresentado, pois a lei não estabelece qualquer prazo para o efeito (prevendo, ao invés, que pode ser apresentado a qualquer momento) e ainda se encontra a decorrer o prazo para a adoção de decisão sobre a reclamação da Vodafone.

Acresce que, enquanto destinatária da decisão impugnada, a Vodafone é diretamente interessada na pretensão formulada, tendo legitimidade para apresentar o pedido de suspensão em análise - que incumbe, assim, apreciar.

III.2. Dos requisitos de procedência do pedido

Conforme decorre do n.º 2 do artigo 189.º do CPA, para que a suspensão da eficácia do ato administrativo - a decisão da ANACOM de 02.08.2018 - seja decretada, oficiosamente ou a pedido do interessado, devem verificar-se dois requisitos cumulativos, a saber:

i) a execução imediata do ato causar prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação ao destinatário (a aqui Requerente, Vodafone); e,

ii) a suspensão não causar prejuízo de maior gravidade para o interesse público.

Determina ainda o n.º 4 do artigo 189.º do CPA que, na apreciação do pedido, a ANACOM deve verificar se as provas revelam uma probabilidade séria de veracidade dos factos alegados pelo interessado, devendo ser decretada, em caso afirmativo, a suspensão.

Importa assinalar, como ponto prévio, que a Vodafone se socorre de argumentos invocados na reclamação apresentada em 27.08.2018. Ora, a análise do pedido de suspensão não se destina a examinar, nem a decidir sobre a procedência de tais argumentos, não se devendo - nem podendo - antecipar, no âmbito da decisão do pedido de suspensão, aquela que deverá ser tomada no procedimento iniciado com a reclamação apresentada, envolvendo, nomeadamente, a audição da outra parte interessada - a MEO.

A apreciação da ANACOM destina-se, assim e tão só, à verificação dos requisitos para o decretamento da suspensão de eficácia da sua decisão de 02.08.2018.

i) Prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação

Conforme reproduzido acima, a Requerente alega a probabilidade séria de existência de prejuízos de caráter económico que estima no valor global de [IIC] [FIC]€.

Importa, antes de mais, relembrar que na sua decisão de 02.08.2018, a ANACOM apenas salientou que “No que respeita aos pagamentos associados ao drop de cliente, entende-se que consistindo a instalação de um drop de cliente na fixação de um cabo em um ou mais postes da MEO, houve sempre lugar ao pagamento por parte da Beneficiária à MEO de um valor mensal de ocupação de uma fixação por um cabo em poste. O preço para este efeito é o que se encontra previsto na tabela 9, número 7.3 da Oferta (i.e., 1,25 €)” e que “não tendo havido quaisquer alterações à versão 3.1 da ORAP, sem prejuízo do SPD aprovado em 25.05.2018 a respeito das alterações da ORAC e da ORAP e cujo procedimento de consulta pública se encontra em curso, como se referiu, entende-se que não há fundamento para que a Vodafone tenha deixado unilateralmente de proceder ao pagamento dos valores referentes à ocupação dos postes da MEO e associados aos drops de cliente que foram instalados, contrariando a atuação que adotou, de forma voluntária, até ao fim do mês de julho/início do mês de agosto de 2017.”

E neste enquadramento apenas determinou que a Vodafone devia “c) Proceder ao pagamento dos montantes referentes à ocupação dos postes da MEO associados aos drops de cliente”, ou seja, a ANACOM não se pronunciou sobre a forma de aplicação do preço, nem sobre valores concretos no que respeita aos pagamentos referentes à ocupação dos postes da MEO associados aos drops de cliente, nem determinou o pagamento de uma quantia certa - pelo que o valor apresentado pela Vodafone resulta dos seus próprios pressupostos de aplicação do preço e dos seus cálculos decorrentes dessas premissas.

Todavia, ainda que se assumisse, para efeitos desta apreciação (e do raciocínio que esta envolve), os valores e pressupostos descritos pela Vodafone para o cálculo dos prejuízos que reputa  de difícil reparação (caso tenha de cumprir de imediato a decisão da ANACOM), entende-se que os mesmos - sendo de caráter/tipo puramente económico (ainda que possivelmente de elevada dimensão) - são suscetíveis de avaliação/quantificação monetária, como resulta demonstrado pelo facto de a própria empresa os quantificar, e, como tal, passíveis de reparação numa futura e eventual reconstrução da situação hipotética através de um reembolso ou de um acerto de contas, tal como a própria Vodafone refere em diversas passagens da sua exposição, pois trata-se de prática comum entre os prestadores de serviços e operadores de redes de comunicações eletrónicas, nas suas relações grossistas.

O facto de a Vodafone afirmar que se trata de uma “quantia tão avultada” - a que a Vodafone prevê ter de pagar na sequência do cumprimento imediato da decisão da ANACOM, que, reitere-se, não determinou o pagamento de uma quantia certa - também não faz com que o correspondente dano monetário seja necessariamente de difícil reparação. Trata-se, aliás, de um conceito indeterminado - o de quantia “avultada” - e que, como tal, carece de concretização atento o contexto da empresa no mercado das comunicações ou, dito de outro modo, considerando a ordem de grandeza dos valores em causa face a indicadores operacionais do respetivo negócio e que a Vodafone não logrou demonstrar.

Em suma, no que se refere especificamente ao valor que a Vodafone estima para efeitos do preenchimento do requisito legal de existência de prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação, entende-se que a argumentação não procede.

Adicionalmente, a empresa invoca para este mesmo efeito factos que, em seu entendimento, são suscetíveis de causar prejuízos de difícil reparação, na medida em que estão associados à perda de competitividade que advirá do alegado acesso por parte da MEO a informação comercial sensível que colocariam a Vodafone numa posição de “desvantagem competitiva”, dando azo a danos para si irreversíveis “já que nunca poderá rasurar-se o facto de a MEO ter tido acesso, em determinado momento, a dados de que nunca deveria ter tido conhecimento”, que “lhe permitem aferir a localização do cliente”.

Relativamente a estes, importa evidenciar que, nos termos do artigo 65.º da Lei das Comunicações Eletrónicas, as empresas devem respeitar a confidencialidade das informações recebidas, transmitidas ou armazenadas antes, no decurso ou após os processos de negociação e celebração de acordos de acesso ou interligação e utilizá-las exclusivamente para os fins a que se destinam. Prevê ainda a citada disposição que estas informações não devem ser transmitidas a outras partes, incluindo outros departamentos, filiais ou empresas associadas, relativamente às quais o conhecimento destas possa constituir uma vantagem competitiva.

Assim sendo, também aqui se entende que a argumentação da Vodafone não procede para efeitos do preenchimento do critério sub judice, atendendo a que a Lei das Comunicações Eletrónicas impõe o respeito pela confidencialidade das referidas informações nos termos acima referidos.

Porém, para esse efeito, a Vodafone vem reiterar nesta sede a “situação discriminatória” em que se encontra face às demais concorrentes no mercado, por “ser a única beneficiária da ORAP que estaria onerada pelo cumprimento das obrigações que a MEO diz resultarem daquela Oferta”.

Sobre esta matéria, relembra-se que na sua decisão de 02.08.2018, a ANACOM referiu que “A Requerida não fundamenta estas alegações que faz de discriminação da MEO em relação a si própria e também não apresenta provas, em concreto, que permitam demonstrar a existência de qualquer tipo de discriminação da parte de MEO em relação à mesma, no tocante ao processo que visa a instalação de drops de cliente no âmbito da ORAP. Pese embora possam existir situações de incumprimento por parte de outras Beneficiárias da Oferta a respeito dos procedimentos visando a instalação de drops de cliente, não se afigura existir, à partida, um comportamento discriminatório da MEO face à ora Requerida.

Neste contexto, importa salientar que a ANACOM teve conhecimento, pela própria MEO, da existência de situações referentes aos procedimentos para a instalação de drops de cliente por parte de outras Beneficiárias desta Oferta que já foram instadas pela MEO à regularização das instalações que tenham sido efetuadas em incumprimento das condições previstas na ORAP, pelo que não se afigura existir, à partida, um comportamento discriminatório da MEO face à ora Requerida”.

Contudo, após a decisão do litígio ora em questão e no âmbito de outro procedimento administrativo, a ANACOM obteve conhecimento e informação, mais extensos e detalhados, sobre os procedimentos seguidos e/ou preços aplicados às demais beneficiárias da ORAP que, no mínimo, recomendam que na sua decisão pondere todo o novo acervo de dados de que agora dispõe, na medida em que os mesmos parecem ser geradores de incerteza quanto aos efeitos do que foi decidido.

Com efeito, resulta, designadamente das pronúncias que diversas entidades apresentaram à ANACOM (em data posterior à decisão reclamada e cuja suspensão de eficácia ora se requer, sublinhe-se) no âmbito da consulta pública relativa ao procedimento administrativo de alteração da Oferta de Referência de Acesso a Condutas (ORAC) e da ORAP (que terminou em 13.08.2018), que a ANACOM passou a estar na posse de informação que indicia que a execução imediata da sua decisão de 02.08.2018 poderá sujeitar a Vodafone ao cumprimento de procedimentos e/ou ao pagamento de quantias a que outra(s) entidade(s) não estão sujeitas.

Esta situação, a ser confirmada, colocará a Vodafone em desvantagem face às demais Beneficiárias (neste caso, da ORAP) que com ela concorrem, e que, no entender da ANACOM, poderão acarretar-lhe, de facto, prejuízos de difícil reparação/reversão.

É assim nesta medida que a ANACOM entende que se encontra preenchido o requisito legal da existência de prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação. 

ii) Grave lesão do interesse público

A aferição do interesse público deve envolver uma avaliação dos objetivos subjacentes à decisão adotada, designadamente com vista a avaliar em que medida uma eventual suspensão da decisão tem impacto no mercado, em questões de concorrência e nos interesses dos utilizadores finais, devendo, mas não tendo um escopo tão limitado, também envolver a avaliação de questões relativas a segurança.

Considerando que a não execução imediata da decisão de 02.08.2018 se prende com os indícios de que a Vodafone poderá ficar numa situação de desvantagem competitiva,
torna-se evidente que a suspensão daquela decisão não causa prejuízo de maior gravidade para o interesse público, preenchendo, nesta vertente, o segundo requisito legal aplicável. Com efeito e a contrario, a não suspensão de eficácia da decisão de 02.08.2018 seria suscetível de causar prejuízo de maior gravidade para o interesse público subjacente à referida decisão, na medida em que se pretendia que a mesma (tal como as demais decisões desta Autoridade) fosse potenciadora da concorrência.

Quanto à questão específica da segurança, reitera-se a posição já assumida no âmbito do procedimento de resolução de litígios (decisão de 02.08.2018 e respetivo relatório de audiência prévia), no sentido de que se reconhece existirem questões de segurança relacionadas com a instalação de drops de clientes nos postes, admitindo-se assim a existência de risco, mas não se considerando o mesmo um risco significativo - o que determinou, naquele contexto, a não adoção de medidas provisórias. Assim, nesta perspetiva, a suspensão requerida não causará prejuízo de maior gravidade para o interesse público.

IV. Conclusão

Pelo exposto, verificando-se o preenchimento, cumulativo, dos requisitos legais previstos no artigo 189.º do CPA, entende-se que pode ser decretada a suspensão da execução da decisão da ANACOM de 02.08.2018, tal como requerido pela Vodafone.

Assim, o Conselho de Administração da ANACOM, ao abrigo da alínea q) do artigo 26.º dos seus Estatutos, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 39/2015, de 16 de março, e nos termos e para os efeitos previstos nos n.os 2 a 4 do artigo 189.º do Código do Procedimento Administrativo, decide deferir o requerimento apresentado pela Vodafone em 31.08.2018 e, consequentemente, decreta a suspensão da sua decisão de 02.08.2018, relativa à resolução administrativa de litígios - incumprimento de procedimentos de instalação de drops de cliente no âmbito da ORAP, até que seja decidida a reclamação de que foi objeto a mesma decisão, devendo, do facto, ser notificadas a requerente e a MEO.

Lisboa, 7 de setembro de 2018.

Notas
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1 Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro, na sua atual redação.