ANACOM determina aos prestadores de serviços de acesso à Internet a cessação das ofertas que violem neutralidade da rede


A ANACOM aprovou um sentido provável de decisão em que determina aos prestadores de serviços de acesso à Internet (PSAI) a cessação das ofertas zero-rating e similares que discriminem, com fundamento em questões de ordem comercial, entre o tráfego relativo a aplicações zero-rated e o restante tráfego. Esta cessação deve acontecer no prazo de 20 dias úteis após a data da decisão final, no caso de ofertas disponíveis para novas adesões; e de 90 dias úteis após a data da decisão final, no caso de contratos atualmente em execução.

Adicionalmente, os PSAI deverão, nesta sequência, enviar à ANACOM, no prazo de 90 dias úteis após a data da decisão final, informação detalhada sobre as alterações efetuadas nas respetivas ofertas para acomodar a decisão desta Autoridade, bem como a informação divulgada aos utilizadores finais.

No âmbito das alterações a realizar pelos PSAI, esta Autoridade recomenda que sejam salvaguardados os direitos e os interesses dos utilizadores, minimizando eventuais impactos decorrentes desse processo de alteração, disponibilizando maiores volumes de dados para acesso geral à Internet, no mínimo equivalentes ao volume total de dados que os utilizadores têm atualmente disponível.

Note-se que, no âmbito de decisão de 2018, vários aspectos já preocuparam a ANACOM relativamente a estas ofertas, que se caracterizam por englobar um plafond específico de dados ou não incluírem quaisquer limites de tráfego para determinadas aplicações ou conteúdos. Este plafond, que é várias vezes superior ao volume de dados que integra o plafond geral de dados das ofertas, encontra-se geralmente integrado no tarifário ou pode ser adicionado mediante o pagamento de um valor extra. No sentido de atenuar os potenciais impactos negativos decorrentes deste tipo de ofertas, nomeadamente ao nível da liberdade de escolha dos utilizadores finais, na referida decisão de 2018 a ANACOM havia já recomendado uma aproximação dos volumes de tráfego entre os diferentes plafonds de utilização, preferencialmente por via do aumento dos volumes de tráfego dos plafonds gerais.

Na sequência da monitorização continuada às ofertas zero-rating e similares que a ANACOM tem vindo a desenvolver, esta Autoridade constatou que as ofertas zero-rating e similares têm vindo a aumentar em Portugal, evoluindo também em diversidade, ao longo dos últimos anos, representando uma proporção significativa das ofertas de acesso à Internet no mercado nacional.

Além disso, destaca-se que os plafonds gerais não têm sofrido alterações significativas ao longo dos últimos anos no que respeita ao volume de dados incluído no tarifário de base, enquanto os plafonds específicos têm, não só passado a estar disponíveis em tarifários que não incluíam este tipo de ofertas, dando origem a novas ofertas com características zero-rating, como em alguns tarifários registou-se mesmo um aumento do limite de tráfego atribuído. Por conseguinte, não existem evidências de que a recomendação da ANACOM, na sua decisão de 2018, tenha sido acolhida pelos PSAI.

Em setembro de 2021, o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) adotou três decisões no âmbito das quais concluiu que as ofertas com características zero-rating eram, por natureza, incompatíveis com o disposto no n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento relativo à Internet aberta, por incumprirem a obrigação geral de tratamento equitativo do tráfego, sem discriminações ou interferências.

Atendendo à evolução do quadro regulamentar a nível europeu, a decisão desta Autoridade de 2018 sobre esta matéria revela-se, no contexto atual, insuficiente para dar cumprimento às regras relativas ao acesso à Internet aberta, na medida em que o juízo de incompatibilidade com o enquadramento legal aplicável que dela decorria se limitava a algumas medidas de gestão de tráfego associadas a certas ofertas zero-rating. Conclui agora a ANACOM, em linha com o TJUE e o BEREC, que estas ofertas, por tratarem de forma diferenciada um conjunto de aplicações, incumprem a obrigação de tratamento equitativo do tráfego prevista no Regulamento relativo à Internet aberta.

É este conjunto de preocupações que está subjacente ao sentido provável de decisão adotado pela ANACOM e que agora estará em consulta pública até 15 de dezembro de 2022.


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