Comunicação da Comissão COM(2005) 400 final, de 14.09.2005



COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS

Comunicação da Comissão


Bruxelas, 14.9.2005
COM(2005) 400 final

 COMUNICAÇÃO DA COMISSÃO AO CONSELHO, AO PARLAMENTO  EUROPEU, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES
 

Uma abordagem da gestão do espectro de radiofrequências assente no mercado, na União Europeia

(Texto relevante para efeitos do EEE)


ÍNDICE

1. Resumohttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55129

2. Utilização eficiente do espectro – necessidade de mudançahttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55130

3. Como irão os mercados do espectro melhorar a eficiência?https://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55131

4. Dimensão comunitária dos mercados do espectrohttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55132

5. Questões fundamentais a considerar para a criação de mercados de espectro europeushttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55133

5.1. Acordo sobre os objectivoshttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55134

5.2. Bandas do espectrohttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55135

5.3. Questões relativas à transiçãohttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55137

5.4. Definição dos direitos sobre o espectrohttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55138

5.5. Coordenação da informaçãohttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55139

5.6. Neutralidade dos serviços e das tecnologiashttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55140

6. Próximas etapas na criação dos mercados de espectrohttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55141

7. Conclusões

https://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=55142


1. RESUMO

A dependência da sociedade moderna em relação às comunicações electrónicas avançadas contribui para uma procura sempre crescente de radiofrequências. Em domínios como a telefonia móvel, o acesso sem fios à Internet ou a radiodifusão televisiva, o espectro é um elemento essencial do nosso quotidiano. A abordagem tradicional da resolução do problema da procura concorrente de frequências assenta num planeamento que especifica quem tem o direito de utilizar o espectro e o modo como o fará, procurando facilitar uma vasta gama de objectivos políticos.

Actualmente, o rápido desenvolvimento tecnológico e a convergência das telecomunicações, dos conteúdos dos media e dos dispositivos electrónicos estão a criar um ambiente dinâmico em que o espectro é um recurso cada vez mais importante. A gestão do espectro não tem acompanhado esta evolução, fazendo aumentar o risco de, na ausência de mudanças, a abordagem tradicional impedir a sociedade de colher os benefícios deste novo ambiente dinâmico. Tendo tido uma posição de liderança mundial no desenvolvimento das comunicações móveis, a Europa corre agora o risco de se tornar um utilizador de tecnologias desenvolvidas noutras partes do mundo, quando teria todas as condições para ser um inovador . Por este motivo, os Estados-Membros estão a rever a sua política para o espectro de radiofrequências. Uma via consiste na utilização de um modelo assente no mercado que proporcione maior liberdade aos intervenientes no mercado para decidirem do modo de utilizar o espectro e diminua os obstáculos no acesso aos direitos sobre o espectro, possibilitando o comércio desses direitos.

Existe ainda o risco de o desfasamento entre a regulamentação e o dinamismo do mercado dos serviços de comunicações sem fios convergentes impedir uma utilização eficiente do espectro, dificultando assim a realização dos objectivos políticos da UE, como o desenvolvimento do mercado interno, da concorrência, da inovação e do crescimento. Uma abordagem fragmentada da reforma do espectro tornará mais difícil alcançar estes objectivos. É neste contexto e na sequência de um vasto processo de debate e consulta públicos que a Comissão propõe a introdução coordenada de mercados do espectro em toda a UE.

Esta proposta é um factor de crescimento e criação de emprego, bem como uma concretização dos objectivos da agenda de Lisboa revista. É ainda um elemento da estratégia que tem em vista uma gestão eficiente do espectro, prevista na iniciativa i2010, assente numa perspectiva de eliminação comum e coordenada das restrições à utilização do espectro em todos os Estados-Membros, a fim de promover uma economia digital aberta e competitiva. Os cidadãos europeus deverão beneficiar directamente deste processo, através de um acesso mais rápido às novas tecnologias e de preços mais baixos nas comunicações.

Partes substanciais do espectro, por exemplo, grosso modo, um terço do espectro abaixo dos 3 GHz (o espectro mais adequado às comunicações terrestres), poderiam possivelmente ser objecto de comercialização e de utilização flexível em 2010 . A comunicação estabelece um quadro para uma utilização do espectro dinâmica e capaz de responder às necessidades.

Em paralelo com a abordagem do espectro assente no mercado, o modelo tradicional continuará a desempenhar o seu papel sempre que estejam em jogo interesses públicos importantes (p. ex., defesa, aviação ou serviços de investigação, como radioastronomia e satélites de observação da Terra). Outra via é a do modelo sem licenciamento , que proporciona maior flexibilidade, permitindo um acesso livre com determinadas limitações técnicas. Cada modelo de gestão é um instrumento útil, sendo importante elaborar uma combinação adequada de todos eles para alcançar os objectivos da política comunitária 1.

Para dar início a este processo na UE de modo coordenado, a Comissão propõe a criação de mercados do espectro e procura obter um acordo a nível político quanto aos seguintes objectivos:

No período que termina em 2010, pôr em prática a nível da UE:

- A possibilidade de comercializar direitos individuais de utilização de frequências num conjunto de bandas do espectro destinadas a serviços de comunicações electrónicas terrestres;

- O direito de utilizar aquelas frequências de modo flexível.

A Comissão tenciona propor as medidas regulamentares necessárias para alcançar este objectivo no decurso da revisão do quadro regulamentar dos serviços de comunicações electrónicas, que terá início em meados de 2006. Em paralelo, para facilitar o desenvolvimento , tão cedo quanto possível, de mercados do espectro, a Comissão lançará um processo de coordenação com o objectivo de evitar atrasos e fragmentações dispendiosas que prejudicam o mercado único enquanto não se alcança uma solução à escala da UE.

2. UTILIZAÇÃO EFICIENTE DO ESPECTRO – NECESSIDADE DE MUDANÇA

Todos os dispositivos de radiocomunicações utilizam o espectro de radiofrequências para transmitir ou receber informações. A generalização das aplicações que utilizam o espectro conduziu a uma procura crescente, difícil de satisfazer no contexto da actual regulamentação que prevê uma gestão rígida do espectro. Sabe-se que o espectro é um recurso escasso. A disponibilidade de espectro é fundamental, não só para a telefonia móvel, a distribuição de media e o acesso sem fios à Internet, mas também para muitas outras aplicações, como a previsão meteorológica, a astronomia e a segurança aérea e marítima. É igualmente fundamental para serviços de interesse público fundamental, como a segurança e a defesa, bem como para dispositivos de utilização quotidiana, como telecomandos e aparelhos auditivos. A procura de espectro de radiofrequências tem subido em flecha.

O modelo tradicional de distribuição do espectro tem sido implementado com base na atribuição de direitos individuais sobre o espectro e na reserva de diversas bandas para determinadas categorias de serviços, sendo a prevenção de interferências o principal objectivo. A dimensão das parcelas de espectro e as condições de utilização limitam frequentemente os utilizadores a tecnologias específicas (p.ex., GSM para algumas das bandas "móveis" ou televisão para parte das bandas de "radiodifusão"). Consequentemente, os direitos individuais proíbem, implícita ou explicitamente, a utilização de outras tecnologias ou a oferta de outros serviços.

Tudo indica que esta abordagem já não é adequada para os serviços de comunicações electrónicas num mundo em desenvolvimento tecnológico acelerado, em que a compartimentação de serviços vai sendo cada vez mais difícil na perspectiva da sua convergência . A digitalização significa que uma tecnologia pode fazer a entrega de um conjunto de serviços de comunicações, como televisão, telefonia e acesso em banda larga. Por outro lado, o progresso técnico está a tornar menos dispendiosos dispositivos que podem funcionar em diferentes frequências. O modelo tradicional não é ágil nem tem capacidade de resposta suficiente para permitir que a sociedade colha os benefícios destes progressos. Esta situação conduz à perda de oportunidades em termos de competitividade, desenvolvimento industrial e criação de emprego, inovação e escolha de serviços para os cidadãos.

Actualmente, muitas partes do espectro são mal utilizadas. As baixas frequências continuam a ser ocupadas por tecnologias mais antigas e menos eficientes, ao passo que as novas tecnologias só têm acesso às frequências mais elevadas, com uma propagação limitada e com custos mais elevados de arranque.

Contexto político

Na perspectiva da Comissão Europeia, a eficiência da gestão do espectro pode ser significativamente melhorada. A Comissão identificou a reforma da gestão do espectro como uma das questões estratégicas na iniciativa i2010, lançada em Junho de 2005. Deu igualmente resposta a esta questão com um conjunto de outras iniciativas, nomeadamente um importante estudo sobre a comercialização de espectro 2, consultas públicas, reuniões de trabalho e ainda a promoção de debates a um nível político elevado.

Em Novembro de 2004, a pedido da Comissão, o Grupo para a Política do Espectro de Radiofrequências (GPER) 3 formulou um parecer sobre a comercialização do espectro de radiofrequências, em que concluía que “a comercialização de espectro pode ser benéfica em determinadas partes do mesmo, desde que sejam tomadas medidas adequadas de salvaguarda” e que “as abordagens da comercialização pelos Estados-Membros devem apresentar alguns pontos comuns”. O GPER sublinhava ainda que “pode ser benéfico definir estas condições de utilização (no licenciamento) de forma tão lata quanto possível, a fim de garantir a neutralidade tecnológica e a flexibilidade nas futuras utilizações do espectro”.

Um relatório de consultoria 4 apresentado em Setembro de 2004 pela Presidência neerlandesa ao Conselho propunha “a passagem a um modelo novo e flexível de reserva de espectro: a UE necessita urgentemente de flexibilizar o seu modelo rígido de reserva de espectro”. Em Dezembro de 2004, o Conselho concluiu que se deveria “continuar a avaliar os diferentes modelos de gestão do espectro, com vista a uma utilização mais flexível e eficiente do mesmo às escalas europeia e mundial, tendo em conta o desenvolvimento de tecnologias novas e inovadoras, bem como os métodos que recorrem aos mecanismos de mercado”.5

3. COMO IRÃO OS MERCADOS DO ESPECTRO MELHORAR A EFICIÊNCIA?

Espera-se que a política de deixar o mercado decidir da utilização e distribuição do espectro para serviços de comunicações convergentes melhore substancialmente a eficiência da utilização do espectro – um objectivo político central do quadro regulamentar das comunicações electrónicas. Esta utilização eficiente é também essencial para outros objectivos da política comunitária, especialmente nos domínios da inovação e do crescimento, tendo um impacto directo no funcionamento do mercado único.

Ganhos

Segundo alguns estudos, a utilização de uma abordagem assente no mercado proporcionará benefícios económicos significativos e melhorará grandemente a escolha dos cidadãos e o acesso a novas tecnologias e serviços, a preços moderados.

O estudo realizado para a Comissão sobre a comercialização do espectro considera que, para os países da UE e do EEE, os ganhos líquidos resultantes da introdução da comercialização do espectro, a par de direitos de utilização flexíveis, ascenderão a 8 – 9 mil milhões de euros por ano . O crescimento da inovação foi considerado o factor mais importante para a obtenção de benefícios, seguido do aumento da concorrência. Calcula-se que o benefício resultante da combinação da possibilidade de comercialização com a flexibilidade de utilização seja dez vezes mais elevado do que o resultante da comercialização de espectro sem flexibilidade. Outro estudo 6 defende que uma reforma no domínio do espectro nos EUA proporcionará aos consumidores um ganho anual de cerca de 77 mil milhões de dólares, como resultado de preços mais baixos para os serviços vocais móveis. Estes resultados quantitativos, embora devam ser vistos apenas como indicadores da ordem de grandeza, apontam claramente para a necessidade de medidas a nível europeu.

Uma abordagem equilibrada

A experiência adquirida com a implementação das diversas abordagens da gestão do espectro evidenciará os pontos fortes e fracos de cada um dos modelos alternativos e contribuirá para identificar o contexto e as bandas em que cada um é vantajoso. Vai sendo já necessário apoiar o desenvolvimento dos mercados do espectro na UE, para evitar uma fragmentação das condições que regem estes mercados na sua fase de desenvolvimento.

4. DIMENSÃO COMUNITÁRIA DOS MERCADOS DO ESPECTRO

O espectro de radiofrequências é gerido essencialmente pelos Estados-Membros a nível nacional e em coordenação internacional. Dada a consciência crescente do impacto que as decisões individuais podem ter nas políticas comunitárias, foram já adoptadas, a nível da União Europeia 7, algumas medidas regulamentares com vista a uma coordenação e a uma maior eficiência. O quadro regulamentar 8 vê na gestão do espectro assente no mercado uma opção e prevê a introdução da comercialização do espectro pelos Estados-Membros, em determinadas condições 9.

O aumento da eficiência na utilização do espectro foi igualmente a principal razão que levou um conjunto de países, dentro e fora da UE, a implementar reformas assentes no mercado ou a dar início ao processo de transição para estas reformas 10.

Uma via comum

A harmonização da utilização do espectro a nível da UE foi levada a cabo com êxito em algumas bandas de frequências com vista à rápida implantação de novas tecnologias e à obtenção de economias de escala. No entanto, a maior parte do espectro não está coordenada a nível da UE e a existência de políticas divergentes nos Estados-Membros continua a limitar o desenvolvimento do mercado interno.

A criação de mercados do espectro de modo coordenado na UE pode atenuar estes problemas e viabilizar ainda uma harmonização de facto que assegure uma utilização mais eficiente. O estudo realizado para a Comissão analisou os efeitos colaterais decorrentes de políticas divergentes para a introdução da comercialização e da flexibilidade. O estudo conclui que se um país decidir não reformar a sua política de gestão do espectro através daquelas medidas, esse facto implicará custos para outros e que, se esse país decidir aderir ao projecto de reforma, tal produzirá benefícios suplementares para os outros . 60 a 70% dos benefícios resultarão das reformas nacionais e os restantes 30 a 40% dever-se-ão ao facto de a transição ocorrer em todos os países da UE. A argumentação qualitativa subjacente a estes modelos de cálculo aponta para efeitos colaterais análogos aos que se produziram na UE com a criação do mercado interno.

A possibilidade de comercializar espectro a nível da UE criará condições para o estabelecimento de serviços transfronteiras sem descontinuidades com base em regras aplicadas em toda a Comunidade e criará um dos maiores mercados do mundo de serviços que recorrem ao espectro. Melhorará rapidamente a competitividade da UE e impulsionará fortemente a inovação.

5. QUESTÕES FUNDAMENTAIS A CONSIDERAR PARA A CRIAÇÃO DE MERCADOS DE ESPECTRO EUROPEUS

É necessário enfrentar determinados desafios na criação dos mercados de espectro; esses desafios só podem ser vencidos com base num acordo à escala comunitária sobre os objectivos políticos e centrando as atenções em alguns aspectos essenciais da implementação.

5.1. Acordo sobre os objectivos

O acordo político deve apontar para a criação de mercados do espectro funcionais até 2010, devendo partes substanciais do espectro ser comercializáveis e objecto de utilização flexível. Tal permitirá que todos os intervenientes se preparem para o novo ambiente de gestão do espectro e garantirá uma transição suave no que toca aos mercados de serviços assentes na utilização do espectro.

5.2. Bandas do espectro

Para alcançar os objectivos acima referidos, a possibilidade de comercialização deve abranger uma parte substancial do espectro. Uma abordagem por etapas centrada num número reduzido de bandas de ensaio não poderá proporcionar maior concorrência e inovação. A simples oferta de um espectro comercializável reduzido implicaria o risco de comportamentos anticoncorrenciais de açambarcamento e reduziria a possibilidade de colher ensinamentos com a experiência.

O espectro utilizado para fins de interesse público, como defesa e serviços científicos, ou gerido a nível mundial, como nos domínios da aviação e dos satélites, não é abrangido por esta proposta.

É consensual e defendida em estudos e consultas públicas a ideia de que as bandas do espectro utilizadas nos serviços de comunicações electrónicas terrestres são as que melhor poderão concretizar os benefícios que os mercados tornarão possíveis. Estas bandas correspondem também, grosso modo, às bandas iniciais seleccionadas por alguns dos Estados-Membros na sua abordagem nacional dos mercados do espectro 11, sendo objecto de trabalhos do GPER no âmbito de uma abordagem estratégica da convergência.

A Comissão propõe a criação de mercados para as frequências actualmente utilizadas para os fins abaixo enumerados, a fim de garantir uma coordenação eficiente que conduza a resultados tangíveis a nível comunitário. Por exemplo:

- Serviços de comunicações móveis terrestres, incluindo, p.ex., frequências para serviços móveis públicos, como GSM e 3G, e frequências utilizadas para grupos fechados de utilizadores, como PMR e PAMR.

- Serviços de comunicações sem fios fixas terrestres, incluindo, p.ex., frequências para lacete local sem fios, acesso sem fios em banda larga e ligações por microondas.

- Serviços de radiodifusão terrestre sonora e televisiva, incluindo, p.ex., frequências para radiodifusão local, regional e nacional.

A escolha das bandas terá de ser validada no processo de coordenação, devendo as propostas legislativas específicas basear-se em avaliações de impacto. Neste contexto, serão devidamente tidos em conta os custos para os operadores económicos de pequena dimensão.

Espera-se que as bandas enumeradas funcionem em breve num regime de mercado. Em muitos casos, estão já atribuídas no âmbito de direitos individuais de utilização de “blocos de frequências” especificados em determinadas zonas geográficas e os titulares dos direitos são também muitas vezes responsáveis pelo planeamento das suas próprias redes e têm experiência de melhoramentos tecnológicos e de interacção com os mercados. A reatribuição de espectro libertado através do dividendo digital constituirá um impulso suplementar para a utilização eficiente destas bandas (embora possa optar-se, para uma parte do dividendo, por outros modelos de gestão) 12.

Embora tenha de se tomar em consideração a natureza especial da radiodifusão de serviço público, deve reconhecer-se que a possibilidade de os utilizadores do espectro comercializarem e utilizarem as frequências de modo mais flexível é uma opção e não uma obrigação. Poderá também ser necessário reavaliar o pressuposto de que a radiodifusão enquanto serviço de interesse público exige automaticamente espectro terrestre, dado que as obrigações de cobertura podem ser cada vez mais cumpridas através de outros meios que não a transmissão sem fios terrestre, atendendo ao desenvolvimento da convergência e de plataformas múltiplas. Tal não contradiz o objectivo de salvaguardar a radiodifusão de serviço público nem a manutenção da validade de outros objectivos da política pública.

O âmbito previsto para as bandas comercializáveis minimizará o risco de açambarcamento do espectro, dado que os operadores não terão recursos nem incentivos para criarem posições dominantes. Na medida em que surjam problemas de concorrência, a legislação neste domínio proporciona, em princípio, soluções adequadas e suficientes. Caso os obstáculos à entrada num mercado resultem de restrições e limitações desnecessárias dos direitos de utilização do espectro, a solução adequada consiste em suprimir tais restrições.

5.3. Questões relativas à transição

Espera-se que a criação de mercados do espectro produza efeitos no valor das actuais licenças, comercializáveis ou não, bem como em investimentos conexos. Tais efeitos poderão afectar de diferentes modos diferentes titulares de direitos. Em qualquer caso, esses efeitos serão o reflexo das condições de licenciamento actuais e futuras e do nível de concorrência na Comunidade.

Ao gerirem a transição para uma abordagem assente no mercado, os Estados-Membros devem ter em conta os interesses legítimos dos titulares de direitos, garantindo simultaneamente a compatibilidade com as exigências da legislação da concorrência e os princípios gerais do direito comunitário. Para evitar penalizar os actuais titulares de direitos, poderá ser necessário, por exemplo, dar-lhes maior liberdade no exercício dos seus direitos e suprimir restrições injustificadas à utilização desses direitos. Este processo deve realizar-se de modo gradual e não-discriminatório, à medida que o valor de mercado dos direitos sobre o espectro evolui.

5.4. Definição dos direitos sobre o espectro

Determinados aspectos dos direitos comercializáveis devem ser objecto de aproximação, como o formato comum (o documento ou "título") e, em última instância, as regras materiais que definem a liberdade dos utilizadores de utilizarem e comercializarem os seus direitos. Assim se reduzirão os custos de transacção, melhorará a transparência do mercado e aumentará a segurança jurídica em toda a UE. Este processo simplificará ainda a mudança de propriedade e incentivará uma utilização eficiente, facilitando assim a inovação em grande escala e economias de escala.

5.5. Coordenação da informação

Para o funcionamento dos mercados do espectro, é essencial o acesso fácil a informações fiáveis. Actualmente, essas informações estão guardadas em bases de dados nacionais que utilizam diferentes formatos. No futuro, deverão ser apresentadas de modo coordenado para facilitar a comparação dos direitos sobre o espectro e permitir que os compradores descubram potenciais vendedores em toda a UE. Assim, é necessário criar um portal do tipo balcão único para toda a UE com acesso a informações sobre reservas, direitos sobre o espectro atribuído (registos nacionais), disponibilidade de espectro comercializável ainda não atribuído ou que será comercializável num futuro previsível, bem como sobre regulamentação e legislação nacionais nesta matéria. Este processo pode ser facilitado com a construção ou expansão das estruturas existentes, como a base de dados EFIS no âmbito do Gabinete Europeu das Radiocomunicações.

5.6. Neutralidade dos serviços e das tecnologias

Dado que as restrições aplicáveis às tecnologias e aos serviços são cada vez mais incompatíveis com a convergência, é importante ver como a comercialização dos direitos se pode combinar com a flexibilidade, ou seja, a possibilidade de um titular de direitos sobre o espectro poder utilizar este para qualquer serviço, desde que cumpra os requisitos técnicos.

A neutralidade tecnológica é um princípio incorporado no actual quadro regulamentar a nível da UE, devendo ser definido para os casos em que se aplica ao espectro, de modo a minimizar as restrições, garantindo simultaneamente que as interferências serão tratadas de modo adequado. No entanto, deve compreender-se que em determinados casos a necessária gestão das interferências impõe restrições que, na prática, são mais benéficas para uma tecnologia do que para outra. A neutralidade dos serviços significa que a escolha do serviço oferecido através dos direitos de utilização do espectro é feita pelo titular dos direitos. Restringir os serviços para os quais o espectro pode ser utilizado é, em geral, uma prática injustificável do ponto de vista da gestão técnica do espectro. No entanto, existem grandes categorias definidas a nível da UIT através dos regulamentos das radiocomunicações para as quais são impostas regras relativas à prevenção de interferências transfronteiras. No domínio das comunicações electrónicas terrestres, estas categorizações estão a tornar-se rapidamente obsoletas.

Pode haver casos em que os benefícios da limitação dos serviços sejam demonstráveis e justificáveis (p.ex., obter a interoperabilidade dos serviços), havendo exemplos de abordagens deste tipo muito bem sucedidas no desenvolvimento de mercados de serviços e na satisfação das necessidades dos consumidores. Assim, é necessário especificar os critérios para a definição dos casos excepcionais em que as restrições de serviço podem ser justificadas na atribuição de direitos de utilização do espectro e adoptar, nos restantes casos, a regra da neutralidade dos serviços.

6. PRÓXIMAS ETAPAS NA CRIAÇÃO DOS MERCADOS DE ESPECTRO

O objectivo principal da presente comunicação é procurar um acordo político a nível da UE sobre o grande objectivo da criação de mercados de espectro até 2010.

Para tal, a Comissão tenciona desenvolver os seguintes aspectos fundamentais de uma abordagem comunitária da comercialização do espectro:

Comerciabilização

- possibilidade de comercializar direitos individuais de utilização de frequências num conjunto definido de bandas do espectro para serviços de comunicações electrónicas

- definição de um processo de inclusão de bandas num regime de comercialização

- desenvolvimento de uma selecção inicial de bandas

Neutralidade tecnológica

- definição de neutralidade tecnológica, estabelecimento de limitações o menos restritivas possível

Neutralidade dos serviços

- definição das condições específicas de oferta de um serviço que possam, no futuro, ser associadas à utilização de bandas

Direitos sobre o espectro

- aproximação dos direitos sobre o espectro; formato comum, seguido de definições comuns de diversos aspectos materiais dos direitos que definem a liberdade dos utilizadores de utilizarem e comercializarem os seus direitos

Transparência

- acesso às informações necessárias para os mercados do espectro, nomeadamente informações sobre reservas e direitos sobre o espectro atribuído (registos nacionais), fornecidas de modo harmonizado através de um portal do tipo balcão único à escala comunitária

Concretamente, na revisão do quadro regulamentar, que terá início em meados de 2006, serão incluídas medidas relacionadas com a possibilidade de comercialização, a neutralidade tecnológica e a neutralidade dos serviços. O processo legislativo deve ser acompanhado de avaliações de impacto e de um diálogo activo com os Estados-Membros, bem como de um processo de coordenação que possa abranger ainda as questões não incluídas na revisão do quadro. Tal permitirá desenvolver a aplicação prática da comercialização, evitando simultaneamente atrasos dispendiosos e fragmentações no curto prazo. Se necessário, a Comissão poderá ainda emitir recomendações. Devem ser criados grupos de coordenação o mais rapidamente possível para trabalharem em aspectos identificados como essenciais. Os processos de coordenação e legislativo devem informar-se e reforçar-se mutuamente.

O processo acima descrito será sistematicamente acompanhado de consultas públicas sobre propostas específicas. A Comissão tenciona dar conta dos progressos realizados no seu relatório anual sobre a política do espectro.

7. CONCLUSÕES

A reforma da gestão do espectro na UE com vista à introdução de uma abordagem de mercado para a distribuição do espectro constitui um importante desafio. No entanto, vale a pena enfrentá-lo, dado que a efectiva criação de mercados de espectro será:

- benéfica para a Europa em termos de competitividade, potencial de inovação e reforço do mercado interno, bem como de aumento da variedade dos serviços oferecidos ao consumidor e de efeitos positivos na criação de emprego e no comércio externo;

- oportuna e necessária, dado que a gestão do espectro tal como tem sido praticada atingiu os seus limites, devido ao progresso tecnológico, ao aumento da procura dos recursos de espectro e à rapidez da evolução das oportunidades de negócios e dos mercados;

- viável no calendário proposto.

A Comissão convida o Parlamento Europeu e o Conselho de Ministros a aprovarem a abordagem descrita na presente comunicação.

Notas
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1 A comunicação COM(2005) 411, "Uma política de futuro em matéria de radiofrequências para a União Europeia: segundo relatório anual" apresenta a perspectiva global da Comissão nesta matéria.
2 Estudo “Conditions and options in introducing secondary trading of radio spectrum in the European Community,” http://europa.eu.int/information_society/policy/radio_spectrum/ref_info/studies/index_en.htm
3 http://rspg.groups.eu.int
4 “Rethinking the European ICT agenda: Ten ICT breakthroughs for reaching Lisbon goals”
5 Resolução do Conselho de 10.12.2004, ver 15472/04 (presse 345)
6 “The economic costs of spectrum misallocation”, Jerry Ellig, Maio de 2005 http://cadep.ufm.edu.gt/telecom/ingles/interior.asp?menu=lecturas
7 Decisão nº 676/2002/CE relativa ao espectro de radiofrequências
8 Directiva-Quadro (2002/21/CE), Directiva Autorização (2002/20/CE)
9 A regulamentação do espectro de radiofrequências é igualmente um elemento importante que contribui para o mercado interno dos equipamentos, em conjunto com a Directiva RTT (1999/5/CE).
10 Na UE, os países são os seguintes: DK, IT, NL, HU, AT, PT, SK, SI, SE e UK.
11 A Comissão tem conhecimento de que alguns Estados-Membros planeiam igualmente submeter outras bandas a uma abordagem assente no mercado.
12 Ver comunicação intitulada “Acelerar a transição da radiodifusão analógica para a digital”, COM(2005) 204, e correspondente documento de trabalho interno, SEC(2005) 661, p.10