Pedido de autorização para aplicação de sobretaxa aos serviços de roaming apresentado pela Vectone Mobile (Portugal) Limited (versão HTML)
I. Pedido da Vectone Mobile (Portugal) Limited
- Em 16.05.2017, a Vectone Mobile (Portugal) Limited (VECTONE) dirigiu à Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM), um pedido de isenção de aplicação do regime de Roam-Like-At-Home (RLAH), tendo a empresa remetido comunicação do mesmo teor em 26.05.2017.
- As comunicações da empresa incluíam:
i) um documento intitulado “Roaming agreement MM(N)L – annexe tarifaire.pdf”, que correspondia a uma cópia de 4 páginas do “Amendment 2” do acordo de MVNO entre a E-Plus Nederland B.V. e a Mundio Mobile (Netherlands) Limited, de 13.10.2011, relativo à prestação de serviços de roaming internacional pela primeira empresa à Mundio e a todos os clientes da Mundio Mobile Holding Ltd e suas afiliadas noutros países onde essa empresa tenha uma participação superior a 50%; e
ii) um ficheiro excel intitulado “Portugal RLAH Final”, contendo diversas folhas com informação sobre custos, receitas, margens, EBITDA, entre outras.
II. Enquadramento legal
3. O pedido apresentado pela VECTONE deve ser analisado no quadro legislativo europeu:
(i) Do Regulamento (UE) n.º 531/2012, relativo à itinerância nas redes de comunicações móveis públicas da União, alterado pelo Regulamento (UE) n.º 2015/2120, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro de 2015 e mais recentemente pelo Regulamento (UE) n.º 2017/920 do Parlamento Europeu e do Conselho de 17 de maio de 2017 (Regulamento do Roaming 1); e
(ii) Do Regulamento de Execução (UE) n.º 2016/2286, da Comissão, de 15 de dezembro de2016, que estabelece regras pormenorizadas sobre a aplicação da política de utilização responsável, sobre a metodologia de avaliação da sustentabilidade da abolição das sobretaxas de itinerância a nível retalhista e sobre o pedido a apresentar pelos prestadores de serviços de itinerância para efeitos dessa avaliação (Regulamento de Execução)2.
4. Em conformidade com o n.º 1 do artigo 6.º-C do Regulamento do Roaming, “[e]m circunstâncias específicas e excecionais, e a fim de assegurar a sustentabilidade do modelo doméstico de tarifação, caso as receitas globais, reais e projetadas, provenientes da prestação de serviços regulados de itinerância a nível retalhista, nos termos dos artigos 6.º-A e 6.º-B, não permitam recuperar os custos globais, reais e projetados, incorridos por um prestador de serviços de itinerância com a prestação desses serviços, esse prestador de serviços de itinerância pode pedir autorização para aplicar uma sobretaxa. Esta sobretaxa só é aplicada na medida do necessário para recuperar os custos de prestação de serviços regulados de itinerância a nível retalhista, tendo em conta as tarifas grossistas máximas aplicáveis”.
5. Compete à ANACOM, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, verificar “se o prestador de serviços de itinerância demonstrou que não pode recuperar os seus custos, nos termos do n.º 1, ficando assim comprometida a sustentabilidade do seu modelo de tarifação doméstica” e autorizar “a sobretaxa caso estejam reunidas as condições previstas no n.º 1 e no presente número”.
6. Nos termos do n.º 4 do citado preceito “[s]alvo se o pedido for manifestamente infundado, ou se a informação nele contida for incompleta, a autoridade reguladora nacional autoriza a sobretaxa no prazo de um mês a contar da data de receção do pedido apresentado por um prestador de serviços de itinerância. Caso a autoridade reguladora nacional considere que o pedido é manifestamente infundado, ou considere insuficientes as informações prestadas, toma uma decisão definitiva no prazo adicional de dois meses, após ter dado ao prestador de serviços de itinerância a oportunidade de ser ouvido, autorizando, alterando ou recusando a sobretaxa”.
Em suma, nos termos do disposto no artigo 6.º-C do Regulamento do Roaming, os prestadores de serviços de itinerância podem pedir às autoridades reguladoras nacionais (ARN) (no caso presente, à ANACOM) autorização para aplicar uma sobretaxa, prestando-lhes todas as informações necessárias nos termos do respetivo Regulamento de Execução. Às ARN, compete autorizar a sobretaxa no prazo de um mês, caso estejam reunidas as condições exigíveis. Caso a ARN considere que o pedido é manifestamente infundado ou considere insuficientes as informações prestadas, a decisão definitiva (de autorização, alteração ou recusa) deverá ser tomada no prazo adicional de 2 meses, devendo para o efeito ser ouvido o prestador.
1 Acessível em: Regulamento (UE) n.º 531/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13.06.2012https://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=1132594.
2 Acessível em: Regulamento de Execução (UE) 2016/2286 da Comissão, de 15.12.2016https://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=1401600.
III. Análise do pedido e informação em falta
7. A ANACOM procedeu a uma análise preliminar da informação remetida pela VECTONE, designadamente face às exigências constantes do Regulamento do Roaming, e do Regulamento de Execução, bem como face às Linhas de Orientação do Organismo de Reguladores Europeus (BEREC) sobre a mesma matéria1, de forma a aferir se a informação remetida pela empresa seria suficiente para que a ANACOM se pudesse pronunciar sobre o pedido de autorização para aplicar uma sobretaxa de itinerância.
8. Na sequência dessa análise, tendo a VECTONE remetido, no que respeita a informação financeira, dados sobre custos, receitas e margens (efetivos e estimados), sem qualquer fundamentação e sem que tenham sido remetidas cópias dos correspondentes registos contabilísticos e/ou financeiros da empresa, e no que respeita a informação de tráfego, sem que tenha sido enviada fundamentação para as estimativas apresentadas, concluiu-se estarem em falta elementos fundamentais para habilitar a ANACOM a uma tomada de decisão informada sobre o assunto.
9. De notar que o Regulamento de Execução e as Linhas de Orientação do BEREC identificam os elementos acima referidos como os que fundamentam o pedido e consequentemente a decisão do regulador.
10. Em concreto, entendeu-se que os seguintes elementos e informações estavam em falta:
a. Proposta de sobretaxas que a VECTONE se propunha aplicar no sentido de assegurar a sustentabilidade do seu modelo de tarifação doméstica.
b. Dados utilizados para determinar as margens apresentadas e os custos reais e estimados, bem como as receitas (reais e estimadas) do fornecimento dos serviços de roaming regulamentados durante o período em causa, incluindo também a identificação e justificação dos pressupostos utilizados para as estimativas de tráfego, incluindo:
i. Contas financeiras e elementos de prova dos compromissos financeiros relativos ao período abrangido pelas projeções. Relativamente às contas efetivas, indicação de que devem abranger um período de 12 meses terminando no trimestre mais recente disponível. No que respeita a estimativas, indicação que devem ser identificados claramente os inputs de base e os detalhes da metodologia adotada na estimação dos valores projetados, e apresentada prova dos compromissos financeiros assumidos;
ii. Comprovativo dos custos específicos de roaming e dos custos conjuntos e comuns incorridos na prestação dos serviços móveis de retalho em geral;
iii. Dados de contabilidade relativos às transações efetuadas durante o período já observado, incluindo a identificação da alocação dos montantes aos centros de custo da empresa.
c. Fundamentação detalhada e clara da ligação entre os valores constantes dos registos financeiros que vierem a ser submetidos e os valores introduzidos no template-resumo de aplicação do mecanismo de sustentabilidade apresentado pela VECTONE.
d. Declaração de um contabilista indicando que os dados utilizados no pedido foram corretamente retirados dos sistemas de gestão/financeiros da empresa e que a metodologia adotada para as projeções apresentadas foi seguida de forma correta e consistente.
e. Informação sobre se as projeções apresentadas têm em conta a aplicação de uma política de utilização responsável (FUP) tal como definido no Regulamento do Roaming.
11. Tendo-se entendido que a informação referida no ponto anterior era indispensável para a avaliação da necessidade de assegurar a sustentabilidade do modelo de tarifação a nível doméstico da VECTONE e em consequência, para a decisão relativa ao pedido apresentado, esta Autoridade solicitou à empresa a informação em causa.
12. O prazo de resposta foi fixado atentos os prazos definidos no Regulamento de Execução para a tomada de decisão, por parte das ARN, em relação aos pedidos de isenção de aplicação do regime de RLAH.
13. Assim, por ofício de 19.05.20172, esta Autoridade, acusando a receção do “pedido de isenção de aplicação do regime de "Roam-like-at-home" remetido pela Vectone por email datado de 16 de maio de 2017” e comunicando que “a informação transmitida pela Vectone para esse efeito não est[ava] completa”, solicitou à empresa, ao abrigo do Regulamento do Roaming e do artigo 108.º da Lei das Comunicações Eletrónicas (Lei n.º 5/2004 na sua redação atual, doravante “LCE” 3), um conjunto de informações e documentação adicionais, fixando o prazo de 26.05.2017 para a respetiva resposta.
14. A comunicação referida no ponto anterior foi também remetida por carta ao mandatário da VECTONE em Portugal.
15. Adicionalmente, e na mesma data, foi também remetida por e-mail, quer para os endereços eletrónicos da VECTONE quer para o endereço eletrónico do seu mandatário em Portugal, cópia das comunicações enviadas na mesma data à empresa e respetivo mandatário, acompanhadas de uma tradução de cortesia4 do conteúdo das referidas comunicações.
16. O ofício para a VECTONE, remetido por serviço de correio expresso, foi rececionado na empresa em 25.05.2017 e o ofício para o mandatário da VECTONE, remetido por carta registada com aviso de receção, foi recebido em 22.05.2017.
17. Atendendo a que, tendo a empresa sido regularmente notificada, não foi rececionada na ANACOM qualquer resposta a este pedido de informação5, esta Autoridade reiterou o seu pedido para que a empresa enviasse a informação em falta, o que fez por fax de 08.06.2017, concedendo um prazo adicional de 10 dias úteis para o efeito. Nesta mesma comunicação, a empresa foi adicionalmente notificada de que na ausência de resposta ao pedido de informação não seria dado seguimento ao procedimento, indeferindo-se o pedido, nos termos e para os efeitos do n.º 3 do artigo 119.º do Código do Procedimento Administrativo.
18. Neste contexto, a ANACOM remeteu ainda ao mandatário da VECTONE, por fax, em 08.06.2017, cópia da comunicação enviada à empresa.
19. Note-se que nestas novas comunicações, também foi solicitada a apresentação do requerimento inicial em língua portuguesa, tendo em consideração o disposto no artigo 54.º do Código do Procedimento Administrativo.
20. Tendo a VECTONE sido regularmente notificada nos termos do n.º 3 do artigo 113.º do Código do Procedimento Administrativo, o prazo de resposta a esta solicitação terminou no passado dia 23.06.2017, não tendo até ao momento sido recebida qualquer resposta por parte da VECTONE ou do respetivo mandatário, nem a este pedido, nem ao efetuado anteriormente e cujo prazo terminou a 26.05.2017.
21. Neste contexto, a ANACOM não dispõe de informações que considera essenciais para avaliar a necessidade de assegurar a sustentabilidade do modelo de tarifação a nível doméstico da VECTONE e, como tal, para decidir quanto ao pedido da empresa de isenção de aplicação do regime de RLAH, o que se traduziria, em caso de deferimento, na autorização de aplicação de uma sobretaxa (ou eventualmente de várias sobretaxas) às comunicações em roaming.
22. Decorre ainda do exposto que o próprio pedido apresentado pela VECTONE não foi efetuado em língua portuguesa, contrariando o disposto no artigo 54.º do CPA que indica que “[a] língua do procedimento é a língua portuguesa” não tendo a empresa, no prazo que lhe foi concedido para o efeito, remetido qualquer informação redigida em português.
1 As Linhas de Orientação do BEREC (BoR(17)56) estabelecem que as Autoridades Reguladoras Nacionais devem tê-las em devida consideração no âmbito da supervisão do Regulamento do Roaming (''NRAs are to take these BEREC Guidelines into utmost account when supervising the Roaming Regulation in their Member States''). As linhas de orientação estão disponíveis em: BEREC Guidelines on Regulation (EU) No 531/2012, as amended by Regulation (EU) 2015/2120 and Commission Implementing Regulation (EU) 2016/2286 (Retail Roaming Guidelines) http://berec.europa.eu/eng/document_register/subject_matter/berec/regulatory_best_practices/guidelines/7005-berec-guidelines-on-regulation-eu-no-5312012-as-amended-by-regulation-eu-no-21202015-excluding-articles-3-4-and-5-on-wholesale-access-and-separate-sale-of-services.
2 Ofício ANACOM-S011557/2017 remetido por serviço de correio expresso.
3 Acessível em: Lei das Comunicações Eletrónicashttps://www.anacom.pt/render.jsp?categoryId=324016.
4 Para a língua inglesa.
5 Note-se que a comunicação da VECTONE rececionada em 26.05.2017, referida no parágrafo 5, não dá resposta à solicitação da ANACOM do dia 19.05.2017, já que remete os mesmos elementos anteriormente enviados com a comunicação do dia 16.05.2017.
IV. Decisão
23. Considerando que, conforme decorre do acima exposto:
a. a VECTONE não apresentou o pedido de autorização de aplicação de sobretaxa (roaming) em língua portuguesa, em conformidade com o disposto no artigo 54.º do Código do Procedimento Administrativo;
b. a VECTONE, tendo sido regularmente notificada para o efeito, não deu resposta aos dois pedidos de informação remetidos por esta Autoridade, de 19.05.2017 e de 08.06.2017, preparados em conformidade com o explicitado no Regulamento do Roaming, no Regulamento de Execução e nas Linhas de Orientação do BEREC, nos quais foram elencadas as informações e elementos tidos por imprescindíveis na avaliação da sustentabilidade do modelo de tarifação a nível doméstico da VECTONE e, consequentemente, indispensáveis para uma tomada de decisão sobre a aplicação de uma sobretaxa ao roaming;
c. em conformidade com o disposto no n.º 3 do artigo 119.º do Código do Procedimento Administrativo, por comunicação da ANACOM de 08.06.2017 a VECTONE foi notificada de que “[n]a ausência de resposta [ao] pedido de informação, e atento o facto de as informações solicitadas serem necessárias à apreciação, por parte da ANACOM, do pedido de isenção apresentado pela Vectone, não ser[ia] dado seguimento [ao] procedimento, indeferindo-se o pedido (…)”; e
d. a VECTONE, tendo tido oportunidade de ser ouvida sobre o sentido provável de decisão, não se pronunciou sobre o mesmo;
o Conselho de Administração da ANACOM, no exercício das competências previstas no artigo 6.º-C do Regulamento do Roaming e no artigo 6.º do Regulamento de Execução, delibera, ao abrigo da alínea q) do n.º 1 do artigo 26.º dos Estatutos da ANACOM, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 39/2015, de 16 de março, e do n.º 3 do artigo 119.º do Código do Procedimento Administrativo, o seguinte:
- não dar seguimento ao presente procedimento, indeferindo o pedido de autorização apresentado pela VECTONE para aplicação de sobretaxa nos tarifários do roaming.