No âmbito da consulta pública lançada pelo ICP-ANACOM em 2009 sobre o dividendo digital, a possibilidade de designar parte deste espectro para serviços de comunicações electrónicas foi, inequivocamente, a matéria que mereceu maior participação e interesse dos respondentes, tendo a maioria defendido a designação, tão cedo quanto possível, da sub-faixa 790-862 MHz para tais serviços.
Conforme referido, também o ICP-ANACOM, em sede da referida consulta pública, partilhou o entendimento de que, face à informação disponível, antevia que a posição final a tomar sobre a questão em discussão fosse no sentido de vir a designar a sub-faixa dos 800 MHz para as comunicações electrónicas 1.
Um dos aspectos que contribui para essa convicção decorre da performance das comunicações electrónicas, em particular das comunicações móveis e, nestas, das que proporcionam acesso de banda larga móvel. Tal performance é evidenciada nos Gráficos 1 e 2.
Gráfico 1 - Penetração do serviço móvel terrestre
na União Europeia - Outubro de 2009
(Clique na imagem para ver o gráfico numa nova janela)
Gráfico 2 - Penetração da banda larga móvel na União Europeia
(cartões dedicados e modems) - Janeiro de 2010
Clique na imagem para ver o gráfico numa nova janela)
Por outro lado, acresce que os dois desafios que a consulta pública permitiu identificar relativos à designação da faixa dos 800 MHz estão, neste momento, ultrapassados. Recorde-se que tais desafios eram:
a. O modelo de introdução da TDT em Portugal, definia a utilização de seis redes - três coberturas de âmbito nacional e três de âmbito parcial do território continental, a que correspondiam seis direitos de utilização de frequências, associados aos Multiplexers A a F, sendo que cinco destes 2 direitos consignavam frequências precisamente na faixa dos 800 MHz 3;
b. A necessidade de ter em consideração a decisão que Espanha viesse a tomar relativamente à faixa dos 800 MHz, uma vez que os estudos técnicos efectuados no âmbito da CEPT demonstraram ser difícil utilizar esta faixa para serviços de comunicações electrónicas num determinado país sem o acordo do país vizinho, tendo em conta o nível de interferências produzido pelas estações digitais de televisão desse país.
Com efeito, relativamente ao primeiro, por deliberação do Conselho de Administração do ICP-ANACOM do passado dia 12 de Julho, foram revogados os direitos de utilização de frequências associados aos Multiplexers B a F atribuídos à PTC 4, com a consequente devolução das frequências a estes associadas. Sublinhe-se que esta devolução não era condição necessária para uma eventual designação da faixa dos 800 MHz para comunicações electrónicas, uma vez que os títulos dos direitos de utilização de frequências atribuídos no âmbito dos concursos públicos em causa, já previam a possibilidade de alteração das frequências atribuídas em caso de ''harmonização a nível internacional ou comunitário''. No entanto reconhece-se que a devolução das referidas frequências acaba por facilitar uma eventual atribuição daquela faixa de frequências a outros serviços que não os de radiodifusão televisiva, por tornar desnecessário o processo de migração dos Multiplexers B a F para outras frequências.
Tal situação não é, no entanto, a que acontece com o Multiplexer A. Neste caso, se vier a ser tomada a decisão de atribuir a faixa de frequências dos 800 MHz para serviços de comunicações electrónicas, será desejável alterar a frequência actualmente atribuída, o que acontecerá em processo autónomo. De resto, à semelhança dos direitos de utilização de frequências associados aos Multiplexers B a F, também quanto ao Multiplexer A se prevê que a frequência atribuída possa vir a ser alterada, nas condições acima referidas.
Quanto ao segundo desafio, a Administração espanhola decidiu em Abril de 2010 acolher a Decisão da Comissão 2010/267/UE e designar a faixa dos 800 MHz para outros serviços de comunicações electrónicas 5, a partir de 2015, em linha com o número crescente de países Europeus que o têm feito.
Resulta assim que os desafios identificados no âmbito da consulta pública desenvolvida pelo ICP-ANACOM se encontram ultrapassados. No entanto, não deve esta Autoridade ignorar que na referida consulta pública foram expressadas opiniões, por parte de entidades relacionadas com a actividade de radiodifusão, contrárias à designação da faixa dos 800 MHz para outros serviços de comunicações electrónicas distintos da radiodifusão, o que importa avaliar devidamente.
O ICP-ANACOM reconhece a importância primordial que a radiodifusão televisiva tem no tecido social português, bem como a relevância de que se reveste enquanto elemento principal no combate à infoexclusão, nomeadamente pela universalidade do seu alcance e pela sua capacidade de descodificação de mensagens. É aliás nessa perspectiva que o ICP-ANACOM tem desenvolvido iniciativas no sentido de reforçar a capacidade tecnológica das diversas plataformas aptas para a difusão e distribuição do sinal de televisão.
Acontece, no entanto, que com uma designação da sub-faixa 790-862 MHz para serviços de comunicações electrónicas, não ficam comprometidas as condições para que a radiodifusão televisiva e em particular a televisão digital terrestre em Portugal possam ter um desenvolvimento sustentável e consentâneo com as legítimas aspirações dos operadores de radiodifusão – e da sociedade em geral – no sentido de haver mais serviços de programas, com diferentes tipos de recepção, de âmbitos geográficos distintos e com melhor qualidade de imagem.
Para garantir que tal aconteça, tornou-se no entanto necessário, estudar a utilização de canais alternativos para a radiodifusão televisiva em Portugal abaixo da frequência 790 MHz, tendo em vista manter um nível de coberturas consentâneo com o desenvolvimento deste tipo de actividade, uma vez que em quatro das dez redes planeadas 6 para Portugal, no âmbito do GE06 7 está prevista a utilização de canais radioeléctricos da sub-faixa 790-862 MHz.
Conforme referido, apesar de Portugal manter a sua soberania no que respeita às atribuições de espectro radioeléctrico a serviços (respeitados naturalmente os acordos internacionais de que é parte), é necessário incluir no respectivo processo de decisão eventuais constrangimentos decorrentes do planeamento efectuado por Espanha. De forma a garantir que uma atribuição da faixa dos 800 MHz a comunicações electrónicas em Portugal mantinha o nível de coberturas actualmente disponível para a radiodifusão televisiva, foi necessário, previamente, avaliar se os canais alternativos - abaixo da frequência 790 MHz - seriam compatíveis com as utilizações definidas naquele país.
Neste enquadramento, realizou-se nos passados dias 15 a 18 de Junho em Zamora, uma reunião de coordenação de frequências entre Portugal e Espanha, na qual se efectuou um pré-acordo com Espanha para potenciar uma eventual designação, também em Portugal, da faixa dos 800 MHz para serviços de comunicações electrónicas. Tal pré-acordo encontra-se formalmente condicionado à decisão que vier a ser tomada em Portugal relativamente àquela faixa de frequências, tendo sido celebrado com o objectivo exclusivo de permitir que tal decisão possa vir a ser tomada, na sequência do procedimento de consulta a que o ICP-ANACOM se encontra vinculado. Realce-se que se tal pré-acordo não tivesse sido celebrado, a consulta pública que aqui se lança, ficaria por sua vez condicionada à celebração de um acordo com a administração espanhola, sobre o qual não haveria qualquer tipo de certeza.
Na sequência da reunião de coordenação com Espanha acima referida, ficou pré-acordado o planeamento, das seguintes redes para o serviço de radiodifusão televisiva digital em Portugal, na faixa de UHF:
a. 2 redes de âmbito nacional, em frequência única, para recepção fixa;
c. 3 redes de âmbito nacional, em multifrequência, para recepção fixa;
d. 1 rede de âmbito distrital, para recepção fixa;
e. 3 redes de âmbito nacional, em MFN, para recepção móvel.
Sublinhe-se que as redes agora pré-acordadas com Espanha não representam uma diferença significativa face ao actualmente existente, na medida em que apenas uma rede nacional em frequência única (de um total inicial de 10 redes) não será mantida 8.
A designação da sub-faixa 790-862 MHz para comunicações electrónicas não esgota a totalidade do espectro radioeléctrico libertado pelo switch-off das emissões de radiodifusão televisiva. De facto esta designação irá afectar 72 MHz de espectro, enquanto o switch-off libertará a significativa quantidade de 407 MHz de espectro radioeléctrico, conforme o Quadro 4.
canal 2 |
canal 3 |
canal 4 |
47-54 MHz |
54-61 MHz |
61-68 MHz |
canal 5 |
canal 6 |
canal 7 |
canal 8 |
canal 9 |
canal 10 |
174-181 MHz |
181-188 MHz |
188-195 MHz |
195-202 MHz |
202-209 MHz |
209-216 MHz |
canal 21 |
canal 22 |
canal 23 |
canal 24 |
canal 25 |
canal 26 |
canal 27 |
470-478 MHz |
478-486 MHz |
486-494 MHz |
494-502 MHz |
502-510 MHz |
510-518 MHz |
518-526 MHz |
canal 28 |
canal 29 |
canal 30 |
canal 31 |
canal 32 |
canal 33 |
canal 34 |
526-534 MHz |
534-542 MHz |
542-550 MHz |
550-558 MHz |
558-566 MHz |
566-574 MHz |
574-582 MHz |
canal 35 |
canal 36 |
canal 37 |
canal 38 |
canal 39 |
canal 40 |
canal 41 |
582-590 MHz |
590-598 MHz |
598-606 MHz |
606-614 MHz |
614-622 MHz |
622-630 MHz |
630-638 MHz |
canal 42 |
canal 43 |
canal 44 |
canal 45 |
canal 46 |
canal 47 |
canal 48 |
638-646 MHz |
646-654 MHz |
654-662 MHz |
662-670 MHz |
670-678 MHz |
678-686 MHz |
686-694 MHz |
canal 49 |
canal 50 |
canal 51 |
canal 52 |
canal 53 |
canal 54 |
canal 55 |
694-702 MHz |
702-710 MHz |
710-718 MHz |
718-726 MHz |
726-734 MHz |
734-742 MHz |
742-750 MHz |
canal 56 |
canal 57 |
canal 58 |
canal 59 |
canal 60 |
canal 61 |
canal 62 |
750-758 MHz |
758-766 MHz |
766-774 MHz |
774-782 MHz |
782-790 MHz |
790-798 MHz |
798-806 MHz |
canal 63 |
canal 64 |
canal 65 |
canal 66 |
canal 67 |
canal 68 |
canal 69 |
806-814 MHz |
814-822 MHz |
822-830 MHz |
830-838 MHz |
838-846 MHz |
846-854 MHz |
854-862 MHz |
Legenda: Radiodifusão Televisiva (negrito); Comunicações Electrónicas (vermelho); A decidir em processo autónomo (azul)
É assim que o ICP-ANACOM entende que a decisão de designar a faixa dos 800 MHz para serviços de comunicações electrónicas é potenciadora de ganhos significativos, do ponto de vista económico e social, não representando qualquer constrangimento relevante no domínio da comunicação social.
De realçar ainda que a disponibilização desde já da sub-faixa 790-862 MHz para serviços de comunicações electrónicas em Portugal, implica que a sua utilização em data anterior a 2015, esteja condicionada à definição de condições técnicas e operacionais, bem como de delimitação geográfica, que permitam a coexistência com os serviços existentes nos países vizinhos (Espanha e Marrocos).
Finalmente, refira-se que o ICP-ANACOM não desconhece a existência de estudos que abordam que a introdução de sistemas inovadores de radiocomunicações no âmbito dos serviços de comunicações electrónicas na faixa dos 800 MHz, poderá ter um reflexo negativo nos serviços oferecidos pelos operadores de cabo. Releva-se no entanto, que os resultados desses estudos são, até ao momento, inconclusivos, estando a ser organizados debates ao nível da Comissão Europeia a qual mandatou o ETSI e o CENELEC para estudarem esta matéria, nomeadamente com vista a normalizar as características dos receptores terrestres de TV e de TV por cabo, visando garantir uma coexistência com os sistemas de comunicações electrónicas que venham a explorar a sub-faixa 790-862 MHz. Esta matéria foi devidamente equacionada pela Comissão no âmbito da Decisão 2010/267/UE.
1 Tal posição tem aliás sido objecto de divulgação em diversos procedimentos de consulta realizados por esta Autoridade nos últimos tempos. Para ilustrar o que se afirma recorde-se o entendimento expresso no relatório relativo ao procedimento geral de consulta e à audiência dos interessados do projecto de decisão relativo à revogação dos direitos de utilização de frequências associados aos Multiplexers B a F ou ainda no relatório da consulta pública sobre o projecto de plano detalhado de cessação das emissões analógicas terrestres.
2 Recorde-se que um dos Multiplexers está associado ao canal 60 (782-790 MHz).
3 Refira-se que a decisão do lançamento do concurso para a atribuição dos direitos de utilização de frequências para a TDT foi tomada com base no Quadro de Nacional de Atribuição de Frequências em vigor, o qual por sua vez, reflectia o acordo de Genebra 2006.
4 Ver Revogação dos direitos de utilização de frequências associados aos Muxes B a Fhttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=1035559.
5 De notar que as utilizações de espectro em Espanha têm influência em cerca de 50% do território nacional, enquanto que as utilizações de espectro em Portugal têm influência em cerca de 10% do território espanhol.
6 Recorde-se que as três redes de âmbito parcial associadas aos Multiplexers D a F, não estão inseridas no GE06, pois a sua utilização era independente das utilizações dos países vizinhos.
7 Acordo a nível da UIT, onde estão inscritas as estações actuais e futuras de televisão digital terrestre e respectivas condições técnicas de emissão.
8 Naturalmente, tal como já acontece actualmente, a existência de redes planeadas não implica necessariamente que os direitos de utilização de tais frequências venham a ser atribuídos, uma vez que se trata de um processo que ultrapassa a competência exclusiva do ICP-ANACOM.