Custos líquidos do serviço universal de telecomunicações


/ / Atualizado em 05.12.2006

Sentido provável da decisão a adoptar relativamente aos custos líquidos da obrigação de prestação de serviço universal

Antecedentes:

1. O Decreto-Lei n.º 458/99, transpondo a Directiva 98/10 de 26/02 e a Directiva 97/33 de 30/06, delimita, à semelhança do ocorrido nos restantes Estados-Membros (e sem prejuízo para uma evolução do âmbito, por forma a acompanhar o progresso da tecnologia, o desenvolvimento do mercado e as modificações da procura por parte dos utilizadores) um conjunto de prestações de serviço universal, a saber:

a) Ligação à rede telefónica fixa, num local fixo, e acesso ao serviço fixo de telefone a todos os utilizadores que o solicitem;

b) Oferta de postos públicos, em número suficiente, nas vias públicas e em locais públicos;

c) Disponibilização de listas telefónicas e de um serviço informativo, que incluam os números de assinantes do serviço fixo de telefone e do serviço telefónico móvel;

2. Conforme decorrente do estabelecido no n.º 3 do art.º 23º do Decreto-Lei n.º 458/99, os serviços abrangidos no Contrato de Concessão e não englobados no Decreto-Lei n.º 458/99 mantêm-se como prestações obrigatórias da concessionária.

3. A PT Comunicações (PTC), entidade que nos termos do Decreto-Lei n.º 219/00 de 09/09, sucede à Portugal Telecom como concessionária, é designada, nos termos do art.º 23º do Decreto-Lei n.º 458/99, como prestador do serviço universal de telecomunicações, no prazo de vigência do contrato de concessão de serviço público de telecomunicações.

4. No actual contexto, compete aos prestadores do serviço universal de telecomunicações demonstrar as margens negativas e submetê-las à aprovação da ANACOM, a qual deve ser precedida de auditoria efectuada pela ANACOM ou por autoridade independente por esta designada (Decreto-Lei n.º 458/99, art.º 12º).

5. Quanto aos modos de financiamento, o Decreto-Lei n.º 458/99  estabelece que, quando justificado, pode ser criado um fundo de compensação do serviço universal de telecomunicações, para o qual contribuem as entidades que exploram redes públicas de telecomunicações e os prestadores de serviço telefónico fixo e móvel.

6. Nos termos da Directiva 97/33 de 30/06, para que tal mecanismo de repartição do custo líquido das obrigações de serviço universal seja efectivamente implementado, é necessário que o Estado-Membro determine que as referidas obrigações representam uma sobrecarga injusta para o prestador do serviço universal.

7. Releva-se a sentença de 30/11/00 do Tribunal Europeu de Justiça no caso C-384/99 opondo a Comissão Europeia ao Reino Belga, nomeadamente quanto à inclusão de benefícios intangíveis no cálculo do custo do serviço universal e quanto à inclusão de custos provenientes de serviços adicionais.

8. Evidencia-se ainda a sentença de 06/12/01 do Tribunal Europeu de Justiça no caso C-146/00 opondo a Comissão Europeia à República Francesa, relativamente à consideração de custos do serviço universal no período prévio à liberalização, à inclusão de benefícios tangíveis e intangíveis provenientes da prestação do serviço universal e quanto ao método de cálculo dos custos do serviço universal.

9. No presente contexto, é ainda importante mencionar a Comunicação da Comissão Europeia (COM 96 (608)) de 27/11 sobre "critérios de avaliação dos regimes nacionais de cálculo dos custos e de financiamento do serviço universal no sector das telecomunicações e orientações para os Estados-Membros sobre o funcionamento de tais regimes", a qual contribui com recomendações específicas neste domínio, por exemplo, no que concerne à adopção de critérios de eficiência no apuramento dos custos do serviço universal.

10. A Portugal Telecom, e posteriormente a PTC, apresentaram duas cartas à Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM) incluindo estimativas e actualização de estimativas dos custos líquidos incorridos com as obrigações de serviço universal respectivamente para o período 1996-1997 (exceptuando o serviço fixo de telefone de 1996) e 1996-1999, em relação aos quais aquela entidade pretenderia o ressarcimento.

Deste modo e considerando que:

11. Não é justificável, designadamente tendo em conta o nível de concorrência então existente, a implementação de um sistema de financiamento dos custos líquidos do serviço universal que implicasse a partilha desses mesmos custos no período prévio à liberalização - posição esta compatível com a decisão de 06/12/01 do Tribunal Europeu de Justiça referente ao caso C-146/00 (opondo a Comissão Europeia à República Francesa);

12. Em 2000, não se verificaram ofertas de chamadas locais e regionais em regime de acesso indirecto na rede da prestadora do serviço universal e que, não foi até à data disponibilizada qualquer oferta de chamadas em regime de acesso indirecto a partir de postos públicos da prestadora de serviço universal;

13. O custo das obrigações do serviço universal é calculado como a diferença entre os custos líquidos, para uma organização, do funcionamento com as obrigações de serviço universal e do funcionamento sem essas obrigações (Decreto-Lei n.º 458/99, art.º 13º, n.º 2) e que (em conformidade com a decisão de 06/12/01 do Tribunal Europeu de Justiça referente ao caso C-149/00 opondo a Comissão Europeia à República Francesa) no cálculo destes custos apenas poderão ser considerados custos precisos, que sejam consequência específica e directa da prestação do serviço universal, não sendo permitida a atribuição de valores imprecisos às diferentes componentes do custo líquido do serviço universal;

14. No cálculo dos custos líquidos deverão ser tidas em conta as receitas e outros benefícios tangíveis e intangíveis decorrentes da prestação do serviço universal (Decreto-Lei n.º 458/99, art.º 13º, n.º 6), conforme decorre também da sentença supramencionada;

15. O apuramento dos custos líquidos do serviço universal, segundo a própria Comissão Europeia (COM 96 (608)), dever-se-á reger pelos custos evitáveis suportados por um operador eficiente, pelo que o cálculo dos custos líquidos do serviço universal deve considerar parâmetros de eficiência no desempenho do serviço, por forma a assegurar que custos derivados de investimentos ineficientes e redundantes no passado não venham a ser considerados como custos do serviço universal;

16. O cálculo do custo decorrente das obrigações do serviço universal deverá ser feito com base em custos e proveitos prospectivos conforme decorrente da Directiva 97/33, e em concordância também com a decisão de 06/12/01 do Tribunal Europeu de Justiça no caso C-149/00;

17. É importante a aplicação de um horizonte temporal coerente ao longo de todo o estudo, por forma a garantir o necessário rigor analítico, sendo de evitar, nomeadamente, o contraste entre uma óptica de curto prazo subjacente à consideração da rede existente na identificação das "actividades não rentáveis" (valorizada de acordo com o custo histórico dos activos) e um horizonte temporal de longo prazo para apuramento de "custos evitáveis" (aos quais seriam implícitos certos padrões de optimização e eficiência), tal como ocorrido em estudos anteriormente apresentados à ANACOM;

18. A imputação dos custos comuns e de parte dos custos conjuntos no apuramento dos custos líquidos do serviço universal deve ser criteriosamente fundamentada e que o prestador do serviço universal deve fornecer dados que permitam determinar claramente as poupanças resultantes das partilhas de custos entre serviços incluídos na prestação do serviço universal e serviços não integrados nas obrigações de prestação do serviço universal;

19. Deve haver uma identificação clara e fundamentada de:

19.1) áreas rentáveis e as áreas não rentáveis;

19.2) clientes rentáveis em áreas não rentáveis e,

19.3) clientes não rentáveis nas áreas rentáveis;

19.4) qual limiar de rentabilidade de um cliente, abaixo do qual o cliente é considerado não rentável;

19.5) custos considerados evitáveis com clientes não rentáveis;

19.6) qual o critério a adoptar na consideração uma área como não rentável.

20. Podem ser consideradas rentáveis determinadas áreas, categorias de consumidores ou postos públicos, se for expectável que a exploração das mesmas se torne económica no curto/médio prazo;

21. Deve ser efectuada uma análise de sensibilidade que entre em conta com cenários alternativos, incluindo entre outros, alterações tarifárias, ganhos de eficiência e penetração de outros serviços (e.g. serviço móvel, televisão por cabo) referindo os possíveis efeitos tanto ao nível de custos líquidos, como relativamente à quantidade de clientes/áreas classificadas como sendo "não rentáveis" e que -  não existindo obstáculos ao rebalanceamento tarifário - o eventual "déficit de acesso" não pode ser considerado nos custos líquidos do serviço universal;

22. Devem ser ponderados os impactos nas receitas das alterações a nível de procura com a eventual cessação da obrigação de prestação do serviço universal, bem como os efeitos de substituição de tráfego, entendidos como a percentagem de chamadas realizadas e terminadas em "actividades/clientes não rentáveis" que, com a descontinuação das obrigações decorrentes da prestação do serviço universal, continuariam a ser realizadas através de outras linhas telefónicas;

23. Os custos líquidos do serviço universal dependem da "taxa de remuneração média aceitável dos capitais utilizados", devendo ser claramente identificada a taxa utilizada na estimativa subjacente aos custos apresentados, entendendo-se, dever-se privilegiar o método de remuneração do capital segundo o método do valor contabilístico, conforme prática regulatória corrente;

24. Quanto à modernização da rede:

24.1) a Comissão Europeia (COM(96) 608) refere expressamente que os custos inseridos no âmbito da modernização normal da rede não devem ser considerados como custos de serviço universal;

24.2) a política e critérios de depreciação, com repercussões a nível dos custos dos serviços, incluídos nas obrigações de serviço universal, devem ser claramente identificados;

25. Os considerandos supramencionados se fazem sem prejuízo da eventual futura divulgação, pela Comissão Europeia, de linhas orientadoras específicas, relativas à metodologia de apuramento dos custos líquidos do serviço universal.

O Conselho de Administração da ANACOM delibera proceder à audiência prévia das partes interessadas nos termos dos artigos 100º e 101º do Código do Procedimento Administrativo, fixando um prazo de 10 dias para que as mesmas entidades se pronunciem, por escrito, sobre a Deliberação que pretende adoptar com o seguinte conteúdo:

1º- Não aceitar aplicar quaisquer mecanismos compensatórios sobre o período anterior à liberalização plena do mercado das telecomunicações.

2º- Solicitar à PTC que, querendo, apresente uma demonstração fundamentada de eventuais custos líquidos associados à prestação do serviço universal de telecomunicações.