3. Análise do pedido


Como ponto prévio, sublinhe-se que a PTC declara que, em cumprimento do artigo 26.º das Bases da concessão do serviço público de telecomunicações1, obteve do Concedente, o Estado português, prévia autorização para promover a operação de fusão ora em causa.

Clarifica-se ainda que, tal como referido supra, a PT Prime não é titular de direitos de utilização de frequências. Caso fosse, estaria a respetiva transmissão sujeita ao procedimento estabelecido pelo artigo 34.º da LCE, designadamente, à exigência, que recai sobre os titulares dos direitos de utilização de frequências, de comunicarem previamente a esta Autoridade a sua intenção. O que, no caso em concreto, significaria que a PT Prime estaria sujeita à obrigação de, previamente à operação de fusão, comunicar ao ICP-ANACOM a sua intenção dado que a mesma envolveria a transmissão dos seus direitos de utilização.

Analisando o pedido em concreto, conclui-se que o processo de fusão por incorporação, que envolveu a transferência global do património da PT Prime para a PTC e no âmbito do qual foram integralmente transmitidas para a sociedade incorporante - a PTC - as obrigações que impendiam sobre a PT Prime, envolve, como tal, uma transmissão dos direitos de utilização de números, a qual deve ser apreciada por esta Autoridade nos termos do artigo 38.º da LCE.

Assim, cabendo ao ICP-ANACOM salvaguardar, nos termos legais aplicáveis e acima referidos, a utilização efetiva e eficiente dos números, importa verificar se, no âmbito desta transmissão de direitos de utilização de números, a sociedade incorporante - a PTC - adquire recursos que não estaria em condições de obter por atribuição primária, atentos os atuais critérios de atribuição, e, consequentemente, decidir sobre as medidas a aplicar caso se verifique uma acumulação de recursos que contrarie estes critérios. Em causa estão sobretudo os critérios baseados em (i) uma taxa de utilização mínima de 60% da capacidade de atribuições anteriores, nos números suscetíveis de atribuição a assinantes, e (ii) atribuições unitárias, para os números que identificam o operador ou a rede.

Como é sabido, as operações de fusão, por incorporação, de dois operadores e a correspondente transmissão de direitos de utilização de números podem gerar situações de acumulação de recursos nos casos em que às empresas envolvidas tenham sido atribuídos direitos de utilização do mesmo tipo de números, na sequência da oferta do mesmo tipo de serviços.

Sendo a PTC e a PT Prime prestadores de serviços da mesma natureza, embora com mercados-alvo distintos, esta transmissão deu origem a que a PTC acumulasse recursos de numeração onde ela própria já detinha também recursos2.

Identificam-se e analisam-se de seguida os casos resultantes da acumulação de recursos de numeração em função do seu tipo. Assim:

A. Nos casos em que os números são usados para identificar pontos de terminação de rede onde se ligam terminais e que identificam os respetivos assinantes - números geográficos e nómadas (gamas "2" e "30") e números de serviços não geográficos (gamas "707", "800" e "808") - entende-se que a acumulação de recursos pode ser autorizada sem condicionantes que impliquem a devolução dos números de telefone em uso, pois tal afetaria os interesses do utilizador, que se traduzem sobretudo na manutenção dos seus números.

Porém, como a defesa dos interesses dos utilizadores deve ser conciliada com o princípio geral da utilização efetiva e eficiente da numeração e, em particular, com o objetivo de assegurar que não existe vantagem competitiva para o prestador que acumula recursos relativamente aos demais que estão no mesmo mercado com inferiores condições de acesso à numeração, importa prever condições que evitem eventual benefício desta natureza.

Tendo, geralmente, os números não geográficos um valor comercial próprio de associação às empresas ou marcas, a facilidade na sua memorização é uma mais-valia que é conferida na forma de agrupar os dígitos que os compõem.

Naturalmente que de um conjunto inicial maior de números livres é possível constituir um conjunto maior de números que se memorizam mais facilmente - "golden numbers".

Por este motivo, sendo importante manter os números não geográficos dos clientes (e.g. call centres), há que, em simultâneo, assegurar a inexistência do referido benefício em relação aos números não atribuídos (vagos ou a vagar) dos blocos excedentes, impedindo a afetação/reafetação desses números, "congelando" assim os blocos a que pertencem.

B. No caso de números que são usados para identificar a rede ou pontos específicos da rede onde não estão ligados utilizadores finais, ou ainda outros números ou códigos para identificar o próprio operador/prestador, impõe-se adotar a alternativa da migração para um único número ou gama, com a devolução dos recursos libertados ao ICP-ANACOM.

Em função da presença ou ausência de efeitos comerciais relativos a estes números, suscetível de poder configurar ou não uma vantagem competitiva indevida, assim se justificam prazos de devolução distintos. Abordagem semelhante foi adotada pelo ICP-ANACOM na sua Decisão de 29 de dezembro de 2008.

i. Números de serviços de apoio ao cliente final - 1624 e 1620 - e números usados como prefixo para a seleção e pré-seleção de operador - 1020 e 1024

São números com valor comercial. Não estando em causa serviços distintos prestados pela PTC e pela PT Prime, entende-se que deve ser descontinuado e devolvido a esta Autoridade um número de cada serviço, num período de tempo razoável para as empresas procederem às alterações na rede e à publicitação ou habituação à mudança dos números ao mercado, minimizando-se assim os impactos para o próprio operador e os seus assinantes. Acresce ainda o facto, para o serviço de apoio ao cliente, de a utilização de um único número, no formato 16xyz, ser compaginável com eventual segmentação do mercado, residencial versus empresarial. À semelhança da Decisão de 2008, é entendido que o prazo de um ano é razoável.

ii. Recursos afetos às redes de dados (X.121) da UIT - União Internacional de Telecomunicações - (DNIC - Data Network Identification Code) e à emissão de cartões no âmbito da recomendação E.118 da UIT - (IIN - Issuer Identification Number)

Com a transmissão, a PTC acumula, com os seus, recursos do mesmo tipo de que dispunha a PT Prime. Não existe também motivo, do ponto de vista da salvaguarda dos direitos dos utilizadores, que justifique aquela acumulação por tempo ilimitado. Porém, também não se vislumbra interesse comercial nestes números que proporcione qualquer vantagem. Por isso, e para resolução de eventuais constrangimentos operacionais ou logísticos a montante da devida devolução, entende-se razoável fixar um período de dois anos para a PTC proceder à devolução destes recursos.

iii. Códigos de rede para a portabilidade (NRN), para efeitos de encaminhamento de chamadas para números portados - código de serviço "D" e 024 (PT PRIME) e 020 (PTC).

O Regulamento da portabilidade, bem como o contrato de prestação de serviços estabelecido entre a Entidade de Referência (ER) e os prestadores com obrigações de portabilidade, dispõem de mecanismos que viabilizam a alteração dos NRN de todos os números portados de um para o outro operador envolvido na fusão, assegurando-se a devolução deste tipo de recurso ao ICP-ANACOM sem impacto assinalável nem para a PTC, nem para os outros operadores envolvidos nas operações de portabilidade.

Da experiência colhida com a decisão de 23 de dezembro de 2009 (Devolução de números pela Sonaecom - alteração de decisãohttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=1000186), em que o ICP-ANACOM reviu as condições associadas à devolução deste tipo de recurso, e atento o volume de números ported-in pela PT Prime, mesmo tendo presente que este envolve, na sua generalidade gamas DDI (Direct Dialling In) de clientes empresariais/corporativos, considera-se não se dever precipitar o processo de migração, atento o impacto na capacidade dos sistemas de todos os operadores com obrigações de portabilidade e nos sistemas da ER, pelo que se entende que o mesmo pode ser desenvolvido por um período de dois anos.

iv. Recursos de numeração do Serviço de Acesso a Redes de Dados, em modo dial-up - gama de numeração "67"

A devolução deste tipo de recursos implica a execução de um processo de migração que requer a alteração das configurações de equipamentos instalados, com custos operacionais e logísticos para os prestadores, desproporcionados com o atual declínio do serviço.

Ora, neste âmbito, o ICP-ANACOM já entendeu, por deliberação de 30 de agosto de 20123, autorizar a acumulação de recursos no código "67" do Plano Nacional de Numeração numa mesma empresa em resultado de processos de fusão com a extinção das sociedades incorporadas ou de aquisição/concentração, envolvendo o serviço de acesso a redes de dados acomodado nesta gama.

Assim, na defesa dos princípios enunciados compete ao ICP-ANACOM determinar, de entre os números cujos direitos foram transmitidos pela PT Prime à PTC, quais os recursos que devem ser devolvidos e em que prazo, e quais as condições a respeitar na utilização dos restantes. Sem prejuízo, importa sublinhar que qualquer número unitariamente atribuído não ativado ou bloco de números sem números ativados ou em tempo de quarentena devem ser sempre devolvido ao ICP-ANACOM.

Face ao exposto, conclui-se que a utilização dos números transmitidos à PTC deve ser sujeita a regras que salvaguardem a sua gestão eficiente, e que, paralelamente, assegurem adequadamente os direitos dos utilizadores e a minimização dos custos dos operadores.

Entende-se, assim, que, com exceção dos recursos acumulados no código "67", os números ou blocos de números que, pelas razões supramencionadas, não podem ser acumulados por um prestador, devem ser objeto de um plano de migração visando a devolução, ao ICP-ANACOM, dos recursos entretanto libertados, podendo a PTC decidir quais os números que são devolvidos em cada tipo de recurso.

Trata-se, esta, de matéria que o ICP-ANACOM acompanhará em pormenor a fim de garantir, por um lado, a efetiva e eficiente utilização dos números pela PTC, e, por outro, a não discriminação de condições de acesso a recursos do Plano Nacional de Numeração entre a empresa e os demais operadores/prestadores de serviços de comunicações eletrónicas.

O referido processo de fusão por incorporação da PT Prime na PTC será considerado em sede de liquidação da taxa devida pela utilização de números, nos termos dos artigos 18.º a 22.º e do anexo III da Portaria n.º 1473-B/2008, de 17 de dezembro, alterada e republicada pela Portaria n.º 296-A/2013, de 2 de outubro.

Notas
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1 Publicadas em anexo ao Decreto-Lei n.º 31/2003, de 17 de fevereiro.
2 Recorda-se a este propósito, situação semelhante já analisada em 2008 pelo ICP-ANACOM e no âmbito da qual, em 29 de dezembro de 2008, foi proferida uma Decisão com medidas específicas para cada tipo de recursos Transmissão de direitos de utilização de números para a SONAECOMhttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=789765.
3 Disponível em Acumulação de números para o serviço de acesso a redes de dados identificado pelo código 67 do PNNhttps://www.anacom.pt/render.jsp?contentId=1136656.