O mercado de segmentos de trânsito constituído pelas ''Rotas NC''


É reconhecido pela CE que num número significativo de rotas, em particular nas de menor capacidade, poderá não ser possível aos operadores alternativos concorrer com o operador histórico, já que estas rotas serão servidas apenas por este (único) operador. Neste sentido, a CE considera que a ARN poderá demonstrar que (uma parte d)o mercado de segmentos de trânsito continuará a cumprir os ''três critérios'' e ser susceptível de regulação ex ante.

1º Critério - Presença de obstáculos fortes e não transitórios à entrada

À partida, não existem quaisquer barreiras legais, administrativas ou regulatórias à entrada no mercado das “Rotas NC”.

Relativamente à persistência de fortes obstáculos natureza estrutural à entrada e ao desenvolvimento da concorrência, importa, segundo a Recomendação, analisar a “estrutura do mercado, ao seu desempenho, à sua dinâmica, incluindo indicadores como as quotas de mercado e as tendências nessa matéria, os preços do mercado e as tendências nessa matéria, assim como a extensão e a cobertura das redes ou infra-estruturas concorrentes”.

O ICP-ANACOM reconheceu, conforme anteriormente exposto, a existência de várias entidades cujas redes já replicavam a cobertura da rede do operador histórico ao nível de alguns segmentos de trânsito, especificamente nas “Rotas C”.

Ao contrário, e como acima analisado, no conjunto dos segmentos de trânsito que constituem as “Rotas NC” não existem, de um modo geral, operadores grossistas alternativos com rede ou com ofertas que lhe possibilitem concorrer com os serviços de circuitos alugados do operador histórico. Isto é, nas “Rotas NC” só o operador histórico 1 está actualmente presente na oferta destes segmentos de trânsito, sendo o único operador com rede de transporte nos mesmos 2.

De acordo com a informação disponível sobre a evolução das redes dos operadores, não se assistiu, desde a última análise de mercado, a uma alteração substancial na dinâmica concorrencial deste mercado, não tendo ocorrido qualquer entrada de novos prestadores neste mercado.

O ICP-ANACOM identificou na anterior análise de mercado as principais barreiras associadas ao controlo por parte do Grupo PT da maior rede de suporte ao serviço de circuitos alugados. Os custos irrecuperáveis (ou afundados), que no caso dos circuitos alugados são extremamente elevados, constituíam uma importante barreira estrutural à entrada 3. Não seria (e não é) economicamente viável para os novos operadores replicarem a totalidade da rede de transporte da PTC - para este efeito, a rede que suporta os segmentos de trânsito entre a maioria 4 das centrais locais da PTC -, devendo também ter-se em conta as significativas economias de escala e de gama associadas à rede de transporte em fibra óptica.

Todas estas barreiras foram consideradas como elevadas e não transitórias, não sendo previsível que pudessem ser reduzidas num período de tempo razoável. De facto, para o conjunto dos segmentos de trânsito que constituem as “Rotas NC”, as barreiras à entrada mantêm-se elevadas, não tendo ocorrido entradas relevantes recentemente (nem se prevê que tal ocorra no curto prazo). Com efeito, o número de centrais locais com operadores co-instalados tem vindo a crescer a um ritmo cada vez menor, estando actualmente estagnado, especialmente o número de centrais locais com dois ou mais operadores co-instalados.

Isto acontece porque no caso específico das “Rotas NC” continua a ser, na prática, muito difícil replicar (toda) a infra-estrutura física do operador histórico, sendo que os operadores alternativos não têm aí fácil acesso a infra-estrutura de fibra óptica e, consequentemente, não conseguem estender, de uma forma economicamente viável, a sua rede de transporte até essas rotas.

Deve salientar-se que, pelas condições específicas das “Rotas NC”, ao nível das próprias infra-estruturas de transporte disponíveis - i.e., da sua menor escala, resultante da menor procura e tráfego a suportar -, o custo associado à oferta de circuitos nestas rotas será comparativamente superior ao custo de fornecer um segmento de trânsito nas “Rotas C”. Acresce que grande parte desses segmentos de trânsito ligam centrais locais situadas em zonas de menor densidade populacional e empresarial e/ou mais remotas (de mais difícil acesso).

Assim, face à:

  • reduzida ou nula infra-estrutura de transporte disponível na maioria dos segmentos de trânsito nas “Rotas NC”, os quais ligam zonais menos densas e/ou mais remotas e de difícil acesso;

  • ausência de entrada de (pelo menos dois) operadores alternativos neste segmento específico e de um outro com capacidade para prestar, a qualquer momento, o serviço de aluguer de circuitos nestas rotas;

  • inexistência de ofertas grossistas de operadores alternativos nas “Rotas NC”; e, consequentemente,

  • elevada quota de mercado, na prática de cerca de 100%, do Grupo PT no mercado das “Rotas NC”,

é razoável afirmar que subsistem barreiras elevadas e não transitórias à entrada no mercado das “Rotas NC”. Numa análise prospectiva, é expectável que esta conclusão não se altere, dadas as evoluções recentes, nomeadamente com a expansão da oferta alternativa mais concentrada nas “Rotas C” e nos segmentos terminais (e.g. rede de acesso em fibra óptica) e, fundamentalmente, com o facto de os investimentos necessários para a construção de infra-estrutura nestas rotas serem muito elevados.

Assim, o ICP-ANACOM considera que o mercado das “Rotas NC” cumpre o primeiro critério para definição de um mercado relevante susceptível de regulação ex ante.

Sendo os três critérios cumulativos, o facto de o primeiro critério ser cumprido não implica, automaticamente, o cumprimento do teste. Far-se-á assim uma análise dos dois restantes critérios.

2º Critério - Tendência do mercado para a concorrência efectiva

Já se reconheceu vir-se a assistir até mais recentemente à construção de infra-estruturas de rede em paralelo, mas fundamentalmente nas principais rotas, ou seja, nas “Rotas C”. De um ponto de vista prospectivo, o ICP-ANACOM considerou ser expectável que esta tendência para a concentração de tráfego naquelas rotas se mantenha ou até se amplie, o mesmo se passando com a oferta de infra-estrutura alternativa por parte dos operadores de rede fixa e utilities.

Com efeito, os investimentos em redes de fibra óptica, principalmente no acesso, mas também ao nível da rede de transporte, que se perspectivam no âmbito das NRA, podem vir a permitir uma extensão da oferta de segmentos de trânsito por parte de operadores alternativos que tenham decidido investir em fibra óptica, mas fundamentalmente ao nível das ligações entre as principais centrais locais (especialmente Lisboa e Porto), já incluídas no mercado das “Rotas C” (vide o Anexo I).

Assim, o ICP-ANACOM entende que um número significativo de rotas - as ligações entre as centrais locais de menor dimensão e/ou localizadas em zonas mais remotas e de menor actividade económica, as “Rotas NC” - continuarão, a curto e médio prazo, a ser servidas apenas pelo operador histórico (ou, no limite e num conjunto muito reduzido de rotas, por mais um operador), dado não ser expectável que os operadores alternativos possam vir a concorrer no mercado dos circuitos alugados com o operador histórico em todo o território nacional.


Dado que o operador histórico é, na generalidade dos casos, o único presente no mercado das “Rotas NC”, i.e. o único operador com rede de transporte nessas ligações, as quotas em volume e em receita do Grupo PT no mesmo mercado são, na prática, de 100%. Não havendo intenção de outras entidades em expandir as suas redes de transporte (mesmo como suporte de novas ofertas baseadas em NRA) de modo a poder oferecer serviços de circuitos alugados grossistas naquelas rotas, e sendo uma eventual expansão morosa, as quotas do Grupo PT no mercado das “Rotas NC” manter-se-ão próximo de 100% no médio prazo e expectavelmente até à realização da próxima análise de mercado, resultando da ausência de dinâmica concorrencial neste mercado de segmentos de trânsito, um indicador claro da não tendência do mercado para a concorrência efectiva.

Considera-se assim que o mercado das “Rotas NC” cumpre também o segundo critério para a definição de um mercado relevante susceptível de regulação ex ante.

3º Critério - Insuficiência da lei da concorrência

O ICP-ANACOM reconhece que não têm existido pedidos frequentes e/ou urgentes de intervenção no mercado. No entanto, tal resulta do facto de existirem actualmente obrigações ex ante impostas ao Grupo PT, entidade com PMS nos mercados grossistas de segmentos de trânsito (que até esta data inclui todos os segmentos, incluindo as “Rotas C” e “Rotas NC”), e não porque a lei da concorrência é suficiente para resolver eventuais disputas.

Esta Autoridade considera ainda prospectivamente que não é de esperar que se registem desenvolvimentos no mercado grossista das “Rotas NC” que alterem a posição de força económica do Grupo PT. Isto é, nestas rotas não existem efectivas alternativas à oferta do operador histórico, podendo este agir de forma completamente independente de outros operadores grossistas, clientes ou potenciais concorrentes, pois estes não podem fornecer o mesmo tipo de serviço.

Conclui-se que, dada a dominância de uma empresa no mercado das “Rotas NC”, suportada em quotas de mercado próximas dos 100%, bem como a manutenção das elevadas barreiras à entrada e à expansão de operadores, e não se perspectivando concorrência potencial, haverá necessidade de regulação ex ante, não sendo a lei da concorrência suficiente para, por si só, resolver os problemas de mercado.

Neste contexto, a lei da concorrência não será suficiente para assegurar um funcionamento efectivo do mercado de circuitos alugados grossistas das “Rotas NC”, cumprindo-se, também, o terceiro critério 5.

Notas
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1 Ou, num número muito limitado de situações, apenas esta entidade e um operador alternativo. Contudo, a existência de um eventual “duopólio” na oferta de segmentos de trânsito nestas rotas não poderia ser considerada a priori garante de uma concorrência efectiva na prestação de serviços.
2 Ainda que possam existir redes ópticas alternativas de extensão limitada em certos troços (nomeadamente de utilities), mas que não são utilizadas pelos operadores grossistas presentes nos mercados de circuitos alugados.
3 Um potencial entrante pretenderá suportar tais custos de investimento se for expectável cobrir os mesmos, bem como os custos de produção, através das receitas conseguidas. O operador histórico (que já fez os seus investimentos) pode assim explorar esta assimetria sinalizando junto do potencial entrante que, caso decida iniciar a actividade naquele mercado, os preços serão demasiado baixos para cobrir os custos irrecuperáveis. Desta forma a entrada é desencorajada.
4 Exceptuando, obviamente, os segmentos de trânsito incluídos no mercado das “Rotas C”.
5 A CE, apesar de poder considerar que a lei da concorrência possa suprir as falhas de mercado nas rotas de menor capacidade, considera irrealista poder-se suportar-se apenas na referida lei enquanto o número de rotas não duplicadas (sem fornecedor alternativo) se mantiver elevado.