1. Âmbito e enquadramento legal


Nos termos previstos na Lei das Comunicações Eletrónicas (LCE)1 (vide artigo 97.º, n.º 1), para que o prestador do serviço universal (PSU) tenha direito a receber uma compensação pelos custos incorridos pela prestação do serviço universal (SU) é necessário que estejam preenchidos dois requisitos cumulativos: (i) que se verifique a existência de custos líquidos do serviço universal (CLSU) e (ii) que estes sejam considerados um encargo excessivo.

O artigo 95.º, n.º 1, da LCE prevê os seguintes mecanismos alternativos para se apurar os CLSU: (i) através de uma metodologia a definir pelo ICP - Autoridade Nacional de Comunicações (ICP-ANACOM) (alínea a)) ou (ii) através do valor indicado pelo PSU num mecanismo de designação do tipo concurso (alínea b)).

Quando se verifica a existência de CLSU, o artigo 97.º, n.º 1, da LCE prevê que o pagamento da compensação devida possa provir, alternativa ou cumulativamente: (i) de fundos públicos (cf. alínea a)) e/ou (ii) da repartição do custo pelas empresas que ofereçam no território nacional, redes de comunicações públicas e serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público, devendo, neste caso, ser estabelecido um fundo de compensação administrado pelo ICP-ANACOM ou por outro organismo independente designado pelo Governo (cf. alínea b)).

Em cumprimento do disposto no art.º 95.º da LCE e em observância do disposto no artigo 96.º da mesma Lei, o ICP-ANACOM em 09.06.2011 aprovou a decisão relativa ao conceito de encargo excessivo, bem como a decisão relativa à metodologia a aplicar no cálculo dos CLSU2.

Ficou estabelecido no número 4 da decisão relativa ao conceito de encargo excessivo que a metodologia de cálculo dos CLSU aprovada pelo ICP-ANACOM seria aplicada no período posterior a 01.01.2007 e até que o(s) PSU(s) por meio de concurso iniciasse(m) a prestação desse serviço.

Na deliberação sobre a metodologia a aplicar no cálculo dos CLSU, foi imposta à PT Comunicações, S.A. (PTC)3 a obrigação de transmitir ao ICP-ANACOM os valores preliminares de CLSU de 2007 a 2009 conforme metodologia definida por esta Autoridade, bem como toda a informação relevante utilizada para o seu apuramento.

Competindo ao ICP-ANACOM assegurar que as estimativas de CLSU apresentadas pela PTC são objeto de auditoria, bem como proceder à aprovação dos valores dos CLSU, nos termos do n.º 4 do artigo 96.º da LCE, o ICP-ANACOM adjudicou à SVP Advisors, S.L.4 a auditoria às estimativas apresentadas pela PTC em 28.11.2011 para os exercícios de 2007 a 2009 e, posteriormente, a auditoria às estimativas reformuladas dos CLSU para os exercícios de 2007 a 2009 enviadas pela PTC em 28.06.20135.

Concluídas as auditorias referidas, o ICP-ANACOM por deliberação de 19.09.2013 aprovou, tendo em conta os resultados das mesmas e a declaração de conformidade emitida pelos auditores relativa às estimativas de CLSU, as últimas contas apresentadas pela PTC, em 28.06.2013, determinando os valores finais de CLSU relativos aos exercícios de 2007 a 2009, conforme expresso na tabela seguinte6.

Tabela n.º 1 - Valores finais dos CLSU relativos aos exercícios de 2007 a 2009

 

2007

2008

2009

CLSU

€ 23.584.976,93

€ 20.168.431,93

€ 23.057.573,48

Resulta assim que o valor global de CLSU relativos aos exercícios de 2007 a 2009, aprovado no ano de 2013, é de 66.810.982,34 euros (sessenta e seis milhões, oitocentos e dez mil, novecentos e oitenta e dois euros e trinta e quatro cêntimos)7.

No âmbito deste processo e considerando as possibilidades previstas no artigo 97.º da LCE, o Governo decidiu optar pela repartição dos custos pelas empresas que, no território nacional, oferecem redes de comunicações públicas e serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público, tendo para o efeito apresentado uma Proposta de Lei ao Parlamento.

A constituição do Fundo de Compensação do Serviço Universal de Comunicações Eletrónicas, e os critérios de repartição dos custos líquidos do serviço universal efetivamente apurados pelas empresas que oferecem redes de comunicações públicas e serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público, veio assim a ser aprovada pela Lei n.º 35/2012, de 23 de agosto (doravante Lei do Fundo).

Conforme disposto no artigo 6.º da citada lei, o fundo destina-se ao financiamento dos CLSU determinados no âmbito dos concursos de designação de PSU, bem como ao financiamento dos CLSU relativos ao período anterior à designação do PSU por concurso.

O artigo 17.º da Lei do Fundo estabelece que o Fundo deve ser acionado para a compensação dos CLSU incorridos até ao início da prestação do SU pelo prestador ou prestadores que vierem a ser designados por concurso sempre que, se verificarem os seguintes requisitos, os quais também já decorrem da LCE (n.º 1 do artigo 97.º):

a) Se verifique a existência de custos líquidos, na sequência de auditoria, que sejam considerados excessivos pelo ICP-ANACOM, de acordo com o previsto na alínea a) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 95.º e nos artigos 96.º e 97.º da Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro, alterada e republicada pela Lei n.º 51/2011, de 13 de setembro;

b) O prestador do serviço universal solicite ao Governo a compensação dos custos referidos na alínea anterior.”.

Note-se ainda que dispõe o n.º 4 deste artigo que o PSU deve solicitar ao Governo a compensação dos CLSU que sejam aprovados na sequência de auditoria no prazo máximo de cinco dias úteis após a notificação da decisão final de aprovação do valor dos referidos custos pelo ICP-ANACOM, dispondo o n.º 5 que o cumprimento das obrigações referidas nos números anteriores, nos prazos aí previstos, constitui requisito do financiamento dos CLSU incorridos no período anterior à designação por concurso.

A PTC foi notificada da decisão final sobre a aprovação dos CLSU relativos aos anos 2007-2009 em 20.09.20138 e por comunicação de 26.09.2013 solicitou ao Governo a respetiva compensação dentro do prazo fixado no n.º 4 do artigo 97.º da Lei do Fundo, tendo o Governo dado conhecimento deste facto ao ICP-ANACOM por ofício recebido nesta Autoridade a 16.07.2014.

O mesmo ofício também transmitiu o despacho exarado pelo Secretário de Estado das Infraestruturas, Transportes e Comunicações relativamente à solicitação da PTC e à constituição do fundo de compensação do serviço universal, proferido nos seguintes termos:

Concordo com o deferimento do requerimento apresentado pela PT Comunicações, S.A. em 26.09.2013, e com o acionamento do fundo de compensação para financiamento dos custos líquidos do serviço universal relativos ao período de 2007-2009, nos termos e com os fundamentos expostos. Remeta-se à Sra. MEF, para os devidos efeitos, dando-se conhecimento ao Sr. ME.”

Encontram-se assim preenchidos os dois requisitos definidos no artigo 17.º da Lei do Fundo - verificação da existência de CLSU, na sequência de auditoria, os quais foram aprovados e considerados excessivos pelo Regulador e solicitação pela PTC ao Governo da compensação dos CLSU aprovados pelo ICP-ANACOM em 19.09.2013, no prazo máximo de cinco dias úteis após a notificação da decisão final - para se poder acionar o Fundo de Compensação.

De acordo com o disposto no artigo 18.º da Lei do Fundo as empresas que oferecem, no território nacional, redes de comunicações públicas e ou serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público estão obrigadas a contribuir para o Fundo de Compensação, sendo que devem efetuar uma contribuição extraordinária para esse efeito.

A presente decisão concretiza o definido na Lei do Fundo, especificamente no que respeita à contribuição extraordinária prevista no artigo 18.º referente à compensação dos CLSU relativos ao período anterior à designação do PSU por concurso aprovados por esta Autoridade em 2013 e que se reportam aos CLSU de 2007-2009.

Com a aprovação do respetivo Sentido Provável de Decisão (SPD) deu-se cumprimento ao disposto n.º 4 do artigo 11.º da referida Lei, aplicável por força da remissão prevista no n.º 3 do artigo 19.º, que exige que se submeta a audiência prévia, nos termos do Código do Procedimento Administrativo, uma lista contendo as seguintes informações:

a) Entidades obrigadas a contribuir para o fundo de compensação;

b) Volume de negócios elegível para cálculo das contribuições devidas ao fundo de compensação;

c) Valor das contribuições de cada entidade, acrescido dos juros compensatórios que eventualmente sejam devidos nos termos do n.º 7 do artigo 11.º da citada lei;

d) Valor da compensação a pagar ao PSU;

e) Retificações e ajustamentos que se justifiquem, designadamente em função dos dados apurados relativamente ao volume de negócios elegível efetivamente realizado, se aplicável.

O SPD foi assim sujeito a audiência prévia das entidades obrigadas a contribuir para o fundo de compensação, de acordo com o disposto nos artigos 100.º e 101.º do Código de Procedimento Administrativo, pelo prazo de dez dias úteis. Foi igualmente sujeito a audiência prévia pelo mesmo prazo, a fixação ou alteração dos valores relativos ao volume de negócios elegível, na sequência de auditoria ou de verificação efetuada pelo ICP-ANACOM.

Foram recebidos dentro do prazo as pronúncias da Companhia I.B.M. Portuguesa, S.A. (Companhia IBM), MEO - Serviços de Comunicações e Multimédia, S.A (doravante MEO9) - empresa que previamente também remeteu um pedido de informação, tendo o ICP-ANACOM transmitido que, estando a decorrer um período de audição prévia, não se pronunciava sobre o requerido -, NOS Açores Comunicações, S.A. (NOS Açores), NOS Comunicações, S.A (NOS), NOS Madeira Comunicações, S.A. (NOS Madeira), ULTRASERVE - Consultoria e Apoio Empresarial, Lda. (Ultraserve), e Vodafone Portugal - Comunicações Pessoais, S.A. (VODAFONE).

Foi recebida fora do prazo a pronúncia da Maritime Communications Partner, AS a qual, por ser extemporânea, não pôde ser considerada no relatório de audição prévia.

As restantes empresas nada disseram, pelo que se entende que, apesar de notificadas para o efeito, optaram por não se pronunciar em sede de audição prévia.

Notas

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1 Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro, alterada e republicada pela Lei n.º 51/2011, de 13 de setembro, e posteriormente alterada pela Lei n.º 10/2013, de 28 de janeiro, pela Lei n.º 42/2013, de 3 de julho e pelo Decreto Lei n.º 35/2014, de 7 de março.
2 Releve-se que subsequentemente a esta decisão foram tomadas outras com impacto na metodologia de apuramento dos CLSU, a saber:
- Deliberação de 29.08.2011 que deferiu parcialmente a reclamação apresentada pela PTC e alterou a deliberação relativa à metodologia de cálculo dos CLSU, no sentido de serem utilizados os preços efetivamente praticados para determinar as zonas não rentáveis e os clientes não rentáveis em zonas rentáveis, bem como para apurar os CLSU nas zonas/clientes não rentáveis;
- Deliberação de 25.11.2011 sobre a aplicação de um efeito elasticidade procura-preço na componente associada aos reformados e pensionistas (nessa deliberação foi determinado que o valor de elasticidade a ser considerado para cálculo dos CLSU deveria ser de -0.1);
- Deliberação de 12.10.2012 que concretizou o conceito de ''custos de acesso anormalmente elevados'', para determinação dos clientes não rentáveis em áreas rentáveis e consequentemente para o apuramento dos CLSU;
- Deliberação de 20.06.2013, que aprova a decisão final sobre os resultados da auditoria aos CLSU da PTC, relativos aos exercícios de 2007 a 2009.

3 De notar que em 2014.12.29 foi registada a fusão por incorporação da sociedade MEO - Serviços de Comunicações e Multimédia, S.A. na PT Comunicações, S.A. tendo a empresa resultante dessa fusão assumido a partir dessa data a designação social MEO - Serviços de Comunicações e Multimédia, S.A.
4 Já após a adjudicação do trabalho à SVP, a empresa alterou a sua designação, passando a chamar-se AXON Partners Group Consulting S.L..
5 O trabalho de auditoria foi efetuado pela AXON em colaboração com a Grant Thornton & Associados, SROC, Lda. Recorde-se que a necessidade de realização de uma segunda auditoria resultou do determinado em sede da deliberação do ICP-ANACOM de 20.06.2013 que determinou que a PTC procedesse ao envio de estimativas de CLSU 2007-2009 reformuladas refletindo as alterações efetuadas ao SCA da PTC relativos a esses anos e o determinado nos pontos 1 e) e 1g) da citada decisão referente à consideração de custos/receitas de instalação não recorrentes de forma anualizada e à correção no modelo de áreas do número de linhas de acesso. A segunda auditoria realizada visou assim verificar a conformidade dos valores ressubmetidos com o determinado pelo ICP-ANACOM na referida deliberação de 20.06.2013.
6 Note-se que esta decisão final foi precedida do respetivo SPD o qual foi submetido a audiência prévia das partes interessadas e a procedimento geral de consulta.
7 Conforme resulta da soma dos valores de cada ano. Note-se que na declaração de conformidade dos auditores relativa às auditorias aos anos em causa, o valor que se encontra expresso para os três anos é 66.810.982,35 euros, relevando-se que a diferença de 1 cêntimo de euro no valor global face ao somatório dos valores individuais resulta da utilização desses valores individuais sem arredondamento.
8 A PTC recebeu esta comunicação em 23.09.2013.
9 Conforme já referido esta é a designação social adotada pela empresa que resulta da fusão da empresa MEO - Serviços de Comunicações e Multimédia, S.A., por incorporação na empresa PT Comunicações, S.A..