Despacho n.º 11808/2023, de 22 de novembro



Negócios Estrangeiros, Economia e Mar, Ambiente e Ação Climática, Infraestruturas e Agricultura e Alimentação

Gabinetes dos Ministros da Economia e do Mar, do Ambiente e da Ação Climática e das Infraestruturas, da Ministra da Agricultura e da Alimentação e do Secretário de Estado da Internacionalização

Despacho


A economia e sociedades atuais dependem, em larga medida, dos serviços de comunicações eletrónicas e das infraestruturas e tecnologias digitais que os suportam e, em particular, dos dados. O volume crescente de dados gerado pelos cidadãos, pela administração pública e pela indústria constitui um potencial vetor de desenvolvimento e de inovação para a economia nacional que importa explorar, nomeadamente em termos de fomento ao investimento em centros de armazenamento e processamento de dados e em todo o ecossistema associado à economia de dados, designadamente em conetividade internacional.

Em muitos países, os centros de dados estão tendencialmente localizados próximo das estações de amarração de cabos submarinos, o que potencia, neste contexto, uma vantagem de Portugal atenta a sua localização geográfica privilegiada para a amarração e interligação de cabos submarinos que ligam a América do Norte, a América Central, a América do Sul e África à Europa, através do Atlântico, bem como de cabos que ligam estes continentes à Europa do Norte e do Sul e ao Médio Oriente (e mesmo Ásia) através do Mediterrâneo. Além da localização geográfica estratégica propícia à interligação de cabos submarinos provenientes do sul, norte e oeste, sem necessidade de trânsito terrestre, Portugal dispõe, ainda, de costas arenosas com declives abruptos que permitem atingir profundidades consideráveis em curta distância, contribuindo quer para um maior nível de proteção dos cabos submarinos contra incidentes de segurança, quer para uma redução de custos de produção dos cabos.

Portugal conta, também, com uma das maiores zonas económicas exclusivas (ZEE) do mundo, que se estende por 1,7 milhões de km2, ao que acresce a plataforma continental estendida para além das 200 milhas náuticas, cujo processo de delimitação está a decorrer junto das Nações Unidas, resultando num total de cerca de 4,1 milhões de km2 de espaço marítimo sob soberania ou jurisdição nacional. Este fator é relevante para que Portugal cumpra o seu desígnio atlântico, quer para fins da exploração económica efetiva da referida zona de soberania, que necessitará para esse efeito de uma densificação significativa e ainda não existente de cobertura de telecomunicações, quer para a proteção dos cabos submarinos no contexto nacional, europeu e da NATO, constituindo uma vantagem estratégica face a outros países da União Europeia, mesmo aqueles com costa marítima no Atlântico Norte.

No entanto, o país poderá não estar a aproveitar todo o potencial associado a esta localização geográfica estratégica para, por um lado, maximizar o número de cabos submarinos internacionais a amarrar na sua costa marítima e, por outro lado, para criar maior valor acrescentado em toda a cadeia de valor associada ao ecossistema relacionado com os cabos submarinos internacionais que amarram em Portugal. A este respeito, como referido, a proximidade de estações de amarração de cabos submarinos é um dos fatores determinantes na decisão sobre a localização de centros de dados de maior dimensão. Não obstante, a nível europeu, as grandes plataformas digitais têm os seus centros de dados, mesmo os designados centros de dados principais, localizados essencialmente no centro e no norte da Europa, no Reino Unido e na Irlanda. Na Península Ibérica, essas entidades têm, até à data, optado por instalar os seus centros de dados em Espanha, em detrimento de Portugal, tendo-se igualmente registado uma tendência recente para localizações mais periféricas como Dublin e Marselha, em detrimento da localização nos centros urbanos com maior densidade de consumidores, nomeadamente em cidades como Frankfurt, Londres, Amesterdão e Paris.

Salvo exceções muito pontuais, a generalidade dos centros de dados existentes em Portugal tem uma dimensão reduzida, servindo essencialmente para satisfazer as necessidades internas das empresas nacionais, quer as próprias empresas de comunicações eletrónicas, quer entidades terceiras com grandes necessidades de alojamento e de processamento de dados. Esta situação tem evoluído e existem investimentos em curso em Portugal para a construção de centros de dados de grandes dimensões, à escala europeia, capazes de satisfazer a procura por parte das referidas grandes plataformas digitais e também porque se vão tornando necessários mais centros de dados em mais pontos na rede. Estes investimentos poderão ser expandidos e facilitados, caso sejam revistas determinadas matérias críticas que permitam aumentar a atratividade do país para o investimento nesta área específica.

Após o XXIII Governo Constitucional ter assegurado as condições para a cobertura da totalidade dos edifícios residenciais e não residenciais no território nacional através da aprovação da «Estratégia Nacional para a Conetividade em Redes de Comunicações Eletrónicas de Capacidade Muito Elevada 2023-2030», através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 139/2022, de 28 de dezembro de 2022, é premente maximizar os benefícios para os cidadãos e para as empresas decorrentes desta conetividade de elevada capacidade, qualidade e capilaridade.

A melhoria da conetividade internacional do país e a proximidade a centros de dados permitirá potenciar a qualidade das ligações de capacidade muito elevada no acesso dos cidadãos e das empresas à Internet e a serviços, assim como permitirá suportar quer o desenvolvimento de indústrias tecnológicas ou a localização de empresas de base tecnológica, quer a respetiva criação de emprego qualificado, contribuindo de forma decisiva para fomentar a digitalização, a inovação e o desenvolvimento científico nacional em diversos sectores de atividade. Todo este ecossistema contribuirá direta e indiretamente para a economia nacional e, deste modo, para o crescimento económico sustentável do país a longo prazo.

É neste enquadramento que se justifica o desenvolvimento de um conjunto de ações abrangente para a conetividade, incluindo a dimensão internacional e infraestruturas de dados, que procure tornar Portugal numa referência mundial em termos de economia digital, alicerçada na utilização de energia proveniente de fontes renováveis de modo ambientalmente sustentável. Com efeito, sendo a energia um dos fatores de produção mais importantes em termos de custos imediatos e de sustentabilidade futura do ecossistema digital e, em particular, dos centros de dados, é primordial o recurso a energia de fontes renováveis, dispondo Portugal, também nesta área, de condições únicas e privilegiadas atendendo à sua capacidade produtiva a preços competitivos de energia de fonte hídrica, solar e eólica, incluindo eólica offshore.

Além do pilar energético, é necessário reforçar o desenvolvimento e apoio a iniciativas que potenciem a melhoria do posicionamento estratégico de Portugal no âmbito da conetividade internacional, com capacidade adequada e redundante, a nível de redes intermédias e com os principais polos digitais europeus e intercontinentais, através de cabos submarinos, complementando a conetividade por via terrestre através de Espanha.

Portugal será mais autónomo e atrativo quanto mais alternativas tiver para a conetividade internacional, com mais escolha em termos comerciais e de qualidade de serviço, robustecendo também a segurança e a resiliência, fortemente dependentes da diversidade de acessos disponíveis. Contudo, tal por si só não é suficiente, importando assegurar que, além de centro de interligação entre sistemas de transmissão internacional Portugal alcance uma posição de relevo na localização de centros de armazenamento e processamento de dados, acrescentando, deste modo, valor à conetividade.

Reconhecendo a importância dos vários fatores que concorrem para a melhoria das condições de atratividade do investimento na economia digital, principalmente nos centros de dados, identificam-se um conjunto de matérias que carecem de desenvolvimento no sentido de potenciar o investimento em centros de dados e em todo o ecossistema associado à economia de dados, incluindo na amarração de cabos submarinos nacionais e internacionais e o reforço de rotas estratégicas por terra que nos liguem às restantes geografias, complementando a Estratégia Nacional para a Conetividade em Redes de Comunicações Eletrónicas de Capacidade Muito Elevada 2023-2030, já vigente mas que se foca, essencialmente, na conetividade nacional a nível da rede de acesso.

Assim, nos termos conjugados do n.º 5 do artigo 14.º, dos n.os 1 e 4 do artigo 20.º, do n.º 1 e da alínea a) do n.º 3 do artigo 26.º, dos n.os 1 e 3 do artigo 27.º e do n.º 4 do artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 32/2022, de 9 de maio, na sua redação atual, determinam o seguinte:

1 - Incumbir a Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos (DGRM) de:

a) Criar no Plano de Ordenamento do Espaço Marítimo Nacional zonas adequadas à instalação de cabos submarinos, com o objetivo da criação de corredores, quer em mar até uma determinada profundidade, quer em terra até uma determinada distância da costa, para um número adequado de cabos e tendo em conta os locais onde existem já estações de amarração de cabos submarinos no território continental (Carcavelos, Seixal, Sesimbra e Sines);

b) Elaborar, em articulação com a Agência Portuguesa do Ambiente, I. P. (APA) e com a Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM), um regime específico de licenciamento de cabos submarinos, que assegure celeridade, clareza e transparência procedimental, que contemple, designadamente:

i) Um portal de licenciamento único para a instalação de cabos submarinos, em complemento à utilização do portal BMar, garantindo a interoperabilidade com o módulo LUA/SILiAmb;

ii) Um procedimento desmaterializado, com a DGRM a assegurar as funções de único ponto de contacto com os investidores em cabos submarinos;

iii) Uma modalidade de licenciamento simplificada aplicável à instalação de cabos submarinos em corredores previamente identificados em plano de afetação;

c) Publicar, em articulação com a APA, um conjunto de medidas genéricas de gestão ambiental, a observar pelos investidores em cabos submarinos, destinadas a evitar, minimizar ou compensar os eventuais impactes negativos esperados na instalação daquelas infraestruturas, a ser publicitada, também, no portal de licenciamento único;

d) Definir, em articulação com as administrações portuárias, um procedimento tendente a facilitar o acesso às zonas onde se encontram implantados os cabos submarinos, dos navios que vão instalar, reparar e manter esses cabos, através de pré-registo a efetuar junto da DGRM;

e) Elaborar, em articulação com a APA e com a ANACOM, uma ficha informativa única a publicitar no endereço institucional das mesmas e no portal de licenciamento único referido na subalínea i) da alínea a) supra, contendo toda a informação necessária para a instalação de cabos submarinos em Portugal, incluindo legislação aplicável, obrigações regulatórias e licenças ou autorizações necessárias.

2 - Incumbir a ANACOM de, no cumprimento da sua missão de coadjuvar o Governo, ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 8.º dos seus Estatutos, aprovados em anexo ao Decreto-Lei n.º 39/2015, de 16 de março:

a) Apresentar proposta legislativa ao Governo que defina as condições técnicas e regulatórias para, sempre que possível, assegurar o enterramento do cabo submarino em toda a extensão na parte terrestre com proteção extra através da metodologia HDD (Horizontal Directional Drilling), em infraestrutura (conduta) com capacidade suficiente para alojar um número adequado de cabos, devendo o acesso a esta infraestrutura ser aberto, não discriminatório e orientado aos custos;

b) Avaliar a forma de disponibilizar, a potenciais investidores, a consulta à informação alojada no sistema de informação de infraestruturas aptas, implementado nos termos do Decreto-Lei n.º 123/2009, de 21 de maio, na sua redação atual, e eventual nível de agregação dessa informação, acautelando eventuais riscos de segurança associados à criticidade da infraestrutura;

c) Disponibilizar informação sobre a identificação dos operadores que dispõem de rede de transporte de comunicações, pelo menos ao nível da freguesia, identificando para cada operador a(s) freguesia(s) onde se localiza(m) o(s) nó(s) desta rede e respetiva ligação;

d) Definir um mecanismo expedito que assegure ou facilite a infraestruturação de redes de comunicações eletrónicas em locais ou rotas de grande procura, nomeadamente decorrente do investimento na construção de centros de dados, que não tenham resposta adequada por parte do mercado;

e) Estabelecer, em articulação com as entidades competentes, os requisitos técnicos de segurança a observar na infraestrutura de cabos submarinos.

3 - Solicitar a cada Administração Portuária a definição dos procedimentos adequados para garantir a passagem dos cabos submarinos nas suas áreas de jurisdição.

4 - Solicitar à Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) que, ao abrigo da alínea a) do n.º 4 do artigo 3.º dos seus Estatutos, aprovados em anexo ao Decreto-Lei n.º 97/2002, de 12 de abril, na sua redação atual, apresente proposta legislativa que estabeleça o modelo regulatório aplicável aos concessionários de serviços públicos essenciais de transporte e distribuição de energia elétrica, de gás natural, gases de petróleo liquefeitos canalizados e de gases de origem renovável que:

a) Construam ou expandam infraestruturas aptas nos traçados que constituem a sua atividade principal em que houver procura devidamente fundamentada por parte de investidores para a instalação de redes;

b) Instalem ou expandam a rede de fibra ótica nas suas infraestruturas aptas, de forma complementar à atividade (principal) da concessão.

5 - Solicitar à Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) que desenvolva e implemente um plano de comunicação e de promoção de Portugal como um país com condições favoráveis ao investimento em cabos submarinos e em centros de dados.

6 - As determinações constantes do presente despacho devem ser concretizadas no prazo de três meses [alíneas c) e e) do n.º 1 e n.º 5], seis meses [alínea b) do n.º 2 e n.º 3] e nove meses [alíneas a), b) e d) do n.º 1 e a), c), d) e e) do n.º 2 e n.º 4].

7 - O presente despacho entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

25 de setembro de 2023. - O Ministro da Economia e do Mar, António José da Costa Silva. - 25 de setembro de 2023. - O Ministro do Ambiente e da Ação Climática, José Duarte Piteira Rica Silvestre Cordeiro. - 23 de setembro de 2023. - O Ministro das Infraestruturas, João Saldanha de Azevedo Galamba. - 25 de setembro de 2023. - A Ministra da Agricultura e da Alimentação, Maria do Céu de Oliveira Antunes. - 25 de setembro de 2023. - O Secretário de Estado da Internacionalização, Bernardo Forjaz Vieira Ivo Cruz.